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Em 2ª Edição 2014, encontre no> Clube de Autores
Se, ao apresentar-se a alguém, você disser que é escritor, prepare-se para ouvir aquela indefectível perguntazinha: “E dá pra viver disso?”.
Pois bem, diante de uma indagação desse tipo, controle-se, respire profundamente, seja bem-educado e responda: “É claro que não, tanto que já penso em entrar para o nobre mundo da política, no qual é perfeitamente possível viver como multimilionário, acumular inúmeros bens, tendo a declaração de rendimentos de um singelo cidadão de classe média. Ainda por cima, transformando-me de escritor em político, receberei o tratamento de ‘sua excelência’, e força alguma sobre a Terra me obrigará a responder perguntas impertinentes.”
Ora, ora, sabido é que apenas um punhado de escritores vive exclusivamente de sua literatura, seja aqui no Brasil, seja no exterior. E tais escritores alcançaram fama e riqueza porque são os melhores em seu ofício? Obviamente, não! Eles pertencem ao seleto grupo dos que tiveram as melhores oportunidades de divulgação, seja por mérito próprio ou pela eficiência de seus apadrinhamentos, e também porque produziram obras ditas populares (muitas delas baseadas em fórmulas de comprovado sucesso editorial).
Você, leitor, pode estar conjeturando se aquele famoso escritor, aquele que recebeu o Prêmio Nobel de Literatura, teve mesmo bons padrinhos na carreira. Terá sido essa a alavanca de seu sucesso mundial? Mas ele não é um gênio?
Permita-me responder nua e cruamente, ainda que a custa de sua indignação ou mesmo desencanto. Aquele premiado escritor não é um gênio. Os gênios são raríssimos e geralmente não fazem tanto sucesso no mercado editorial (livros de jovens prostitutas logo se transformam em best-sellers, enquanto os romances de Marcel Proust só fazem embolorar nas prateleiras das livrarias). Uma análise fria e realista dos fatos nos revelará que, entre outras coisas, o tal escritor premiado com o Nobel (o suposto gênio das Belas Letras) sempre contou, ao longo de toda a sua carreira literária, com a colaboração eficiente de um vasto contingente de amigos acadêmicos, jornalistas, pessoas engajadas em determinada corrente político-ideológica. Abracadabra! Ali estava o truque do mágico!
Sendo assim, que fique muito claro: em literatura, como em qualquer outra atividade humana, o talento, por maior que ele seja, não basta para nos ungir com o reconhecimento público, tampouco para nos conceder o retorno financeiro que almejamos.
Mas será mesmo que o verdadeiro escritor, o escritor fiel ao seu propósito de produzir arte honesta e de qualidade, deve viver em função da conquista da fama e da fortuna? Será que ele deve trabalhar seus textos literários com o objetivo de torná-los mais palatáveis ao gosto de uma suposta classe de leitores, ou ao gosto de determinados críticos literários? Tais perguntas, mais cedo ou mais tarde, acabam sendo feitas e respondidas pelos jovens escritores.
Sirvo-me agora de um episódio real, para demonstrar o quão enganosas são as idéias que muitas pessoas mantêm a respeito da arte e do ofício literário.
Anos atrás, aproximou-se de mim um parente e declarou que iria escrever um livro. Fiquei surpreso e perguntei-lhe se o livro seria um romance, uma novela ou uma coletânea de contos. O tal parente respondeu-me, muito candidamente, que ainda não decidira qual o gênero, nem qual o tema do livro a ser escrito. Não é espantoso? Ele queria publicar por publicar, porque deve achar muito elegante ter o próprio nome na capa de um livro. Quanta ilusão!
Seria o caso dessa criatura se perguntar por que voa o passarinho.
Será que o passarinho voa por exibicionismo? Será que ele voa porque voar é infinitamente mais elegante do que andar? Ou bater asas e ganhar os ares é da natureza das aves, assim como nadar é da natureza dos peixes, e não andar, nem tampouco voar?
E por que escreve o escritor? Por que é fino escrever livros? Ou escreve porque é de sua natureza expressar idéias e emoções de modo artístico, por meio da palavra escrita?
É claro que, num mundo ideal, todo escritor teria uma carreira de garantido sucesso comercial, receberia rios de dinheiro, moraria em castelos do Loire, e viveria sossegadamente a criar os seus enredos e personagens. O mundo real, contudo, está longe de ser tão generoso com os verdadeiros artistas. Por outro lado, há recompensas muito preciosas no caminho de um escritor, famoso ou não, que se mostre honesto com sua arte. Produzir uma boa obra, ainda que esta seja um poema de duas linhas, pode trazer alegrias indizíveis ao autor. Saber-se lido e compreendido, ainda que por poucos, é quase um pequeno milagre.
Se, dentro de você, existe o sincero desejo de apresentar idéias e sentimentos por meio da escrita literária, não se retraia diante dos pequenos ou grandes obstáculos. Escreva, simplesmente. Escreva todos os dias, se possível. Escreva com o honesto propósito de oferecer o melhor de si mesmo. Literatura é arte, e não existe arte sem verdade, sem coragem e sem paixão.