sexta-feira, 28 de dezembro de 2007
Cada pessoa...
Cada pessoa que passa em nossa vida,
passa sozinha, porque cada pessoa
é única e nenhuma substitui a outra.
Cada pessoa que passa em nossa vida,
passa sozinha, mas não vai sozinha e nem nos deixa só,
porque deixa um pouco de si e leva um pouco de nós.
Há os que levam muito e deixam pouco,
há os que levam pouco e deixam muito.
Esta é a mais bela responsabilidade da vida
e a prova de que não nos encontramos por acaso.
Charles Chaplin
O crime do silêncio
despotismo é a maneira mais covarde de servi-lo; não
denunciá-lo é auxiliá-lo; estar próximo dele sem feri-lo é a
maneira mais vil de protegê-lo; e proteger o crime é mil vezes
pior que cometê-lo; eis aí a hora em que a palavra é um dever
e o silêncio é um crime"
BAZZO, Ezio Flavio
E na América Latina...
Medo
No entanto não quero levantar barricadas por medo do medo. Eu quero viver, e não quero encerrrar-me. Não quero ser amigável por ter medo de ser sincero Quero pisar firme porque estou seguro e não para encobrir meu medo.
E, quando me calo, quero fazê-lo por amor e não por temer as consequências de minhas palavras.
Não quero acreditar em algo só pelo medo de não acreditar. Não quero filosofar por medo que algo possa atingir-me de perto.
Não quero dobrar-me, só porque tenho medo de não ser amável. Não quero impor algo aos outros pelo medo de que possam impor algo a mim; por medo de errar, não quero tornar-me inativo. Não quero fugir de volta para o velho, o inaceitável, por medo de não me sentir seguro no novo. Não quero fazer-me de importante porque tenho medo de que senão poderia serignorado. Por convicção e amor, quero fazer o que faço e deixar de fazer o que deixo de fazer.
Do medo quero arrancar o domínio e dá-lo ao amor. E quero crer no reino que existe em mim.
Rudolf Steiner
Normose
Todo mundo quer se encaixar num padrão. Só que o padrão propagado não é exatamente fácil de alcançar. O sujeito "normal" é magro, alegre, belo, sociável, e bem-sucedido. Quem não se "normaliza" acaba adoecendo.
A angústia de não ser o que os outros esperam de nós gera bulimias, depressões, síndromes do pânico e outras manifestações de não enquadramento. A pergunta a ser feita é: quem espera o que de nós? Quem são esses ditadores de comportamento a quem estamos outorgando tanto poder sobre nossas vidas? Eles não existem.
Nenhum João, Zé ou Ana bate à sua porta exigindo que você seja assim ou assado. Quem nos exige é uma coletividade abstrata que ganha "presença" através de modelos de comportamento amplamente divulgados. Só que não existe lei que obrigue você a ser do mesmo jeito que todos, seja lá quem for todos. Melhor se preocupar em ser você mesmo.
A normose não é brincadeira. Ela estimula a inveja, a auto-depreciação e a ânsia de querer o que não se precisa. Você precisa de quantos pares de sapato? Comparecer em quantas festas por mês? Pesar quantos quilos até o verão chegar? Não é necessário fazer curso de nada para aprender a se desapegar de exigências fictícias. Um pouco de auto-estima basta.
Pense nas pessoas que você mais admira: não são as que seguem todas as regras bovinamente, e sim aquelas que desenvolveram personalidade própria e normal de cada um tem que ser original. Não adianta querer tomar para si as ilusões e desejos dos outros. É fraude. E uma vida fraudulenta faz sofrer demais. Eu não sou filiada, seguidora, fiel, ou discípula de nenhuma religião ou crença, mas simpatizo cada vez mais com quem nos ajuda a remover obstáculos mentais e emocionais, e a viver de forma mais íntegra, simples e sincera. Por isso divulgo o alerta: a normose está doutrinando erradamente muitos homens e mulheres que poderiam, se quisessem, ser bem mais autênticos e felizes .
Martha Medeiros
Três rainhas "magas"
Elas não teriam se perdido.
Teriam chegado na hora certa.
Teriam ajudado no parto.
Teriam limpado o estábulo.
Teriam levado presentes “úteis”.
E também alguma coisa para comer.
Mas os comentários entre elas também mudariam.
-
-Você reparou que as sandálias da Maria não combinavam nada com a túnica?
-Como eles podem viver com todos esses bichos em casa?
-Espero que eles me devolvam o “tupperware” que eu levei com a torta…
-Dizem que o José está desempregado.
-O pobre do jumento está nas últimas… Virgem? Não me faça rir! Eu conheço a Maria desde a faculdade…
-O menino não se parece nem um pouco com o José…
Redação feita por uma aluna de Letras...
Nota: ISTO, EM PORTUGAL!
Era a terceira vez que aquele substantivo e aquele artigo se encontravam no elevador.
Um substantivo masculino, com aspecto plural e alguns anos bem vividos pelas preposições da vida. O artigo, era bem definido, feminino, singular. Ela era ainda novinha, mas com um maravilhoso predicado nominal. Era ingénua, silábica, um pouco átona, um pouco ao contrário dele, que era um sujeito oculto, com todos os vícios de linguagem, fanático por leituras e filmes ortográficos.
O substantivo até gostou daquela situação; os dois, sozinhos, naquele lugar sem ninguém a ver nem ouvir. E sem perder a oportunidade, começou a insinuar-se, a perguntar, conversar. O artigo feminino deixou as reticências de lado e permitiu-lhe esse pequeno índice.
De repente, o elevador pára, só com os dois lá dentro.
Óptimo, pensou o substantivo; mais um bom motivo para provocar alguns sinónimos. Pouco tempo depois, já estavam bem entre parênteses, quando o elevador recomeçou a movimentar-se. Só que em vez de descer, sobe e pára exactamente no andar do substantivo.
Ele usou de toda a sua flexão verbal, e entrou com ela no seu aposento.
Ligou o fonema e ficaram alguns instantes em silêncio, ouvindo uma fonética clássica, suave e relaxante. Prepararam uma sintaxe dupla para ele e um hiato com gelo para ela.
Ficaram a conversar, sentados num vocativo, quando ele recomeçou a insinuar-se. Ela foi deixando, ele foi usando o seu forte adjunto adverbial, e rapidamente chegaram a um imperativo.
Todos os vocábulos diziam que iriam terminar num transitivo direto.
Começaram a aproximar-se, ela tremendo de vocabulário e ele sentindo o seu ditongo crescente. Abraçaram-se, numa pontuação tão minúscula, que nem um período simples, passaria entre os dois.
Estavam nessa ênclise quando ela confessou que ainda era vírgula.
Ele não perdeu o ritmo e sugeriu-lhe que ela lhe soletrasse no seu apóstrofo. É claro que ela se deixou levar por essas palavras, pois estava totalmente oxítona às vontades dele e foram para o comum de dois géneros.
Ela, totalmente voz passiva. Ele, completamente voz activa. Entre beijos, carícias, parónimos e substantivos, ele foi avançando cada vez mais.
Ficaram uns minutos nessa próclise e ele, com todo o seu predicativo do objeto, tomava a iniciativa. Estavam assim, na posição de primeira e segunda pessoas do singular.
Ela era um perfeito agente da passiva; ele todo paroxítono, sentindo o pronome do seu grande travessão forçando aquele hífen ainda singular.
Nisto a porta abriu-se repentinamente.
Era o verbo auxiliar do edifício. Ele tinha percebido tudo e entrou logo a dar conjunções e adjetivos aos dois, os quais se encolheram gramaticalmente, cheios de preposições, locuções e exclamativas.
Mas, ao ver aquele corpo jovem, numa acentuação tónica, ou melhor, subtónica, o verbo auxiliar logo diminuiu os seus advérbios e declarou a sua vontade de se tornar particípio na história. Os dois olharam-se; e viram que isso era preferível, a uma metáfora por todo o edifício.
Que loucura, meu Deus!
Aquilo não era nem comparativo. Era um superlativo absoluto. Foi-se aproximando dos dois, com aquela coisa maiúscula, com aquele predicativo do sujeito apontado aos seus objetos. Foi-se chegando cada vez mais perto, comparando o ditongo do substantivo ao seu tritongo e propondo claramente uma mesóclise-a-trois.
Só que, as condições eram estas:
Enquanto abusava de um ditongo nasal, penetraria no gerúndio do substantivo e culminaria com um complemento verbal no artigo feminino.
O substantivo, vendo que poderia transformar-se num artigo indefinido depois dessa situação e pensando no seu infinitivo, resolveu colocar um ponto final na história. Agarrou o verbo auxiliar pelo seu conetivo, atirou-o pela janela e voltou ao seu trema, cada vez mais fiel à língua portuguesa, com o artigo feminino colocado em conjunção coordenativa conclusiva.
Fernanda Braga da Cruz
quinta-feira, 27 de dezembro de 2007
quarta-feira, 26 de dezembro de 2007
terça-feira, 25 de dezembro de 2007
Uma mulher chegou em casa e disse para o marido:
- Zé, lembra das enxaquecas que eu costumava ter toda vez que nós íamos fazer amor?
Estou curada.
- Não tem mais dor de cabeça?!?!- O marido perguntou espantado.
A esposa respondeu:
- Minha amiga Margarete me indicou um terapeuta que me hipnotizou. O médico me disse para ir para frente do espelho, me olhar bem no espelho e repetir para mim mesma. Não tenho mais dor de cabeça. Não tenho mais dor de cabeça. Não tenho mais dor de cabeça.
Fiz isso e a dor de cabeça parece que sumiu.
- O marido respondeu: Mas que maravilha!
Então a esposa falou para o marido.
- Nos ultimos anos você não anda muito interessado em sexo. Por que você não vai ao terapeuta e tenta ver se ele te ajuda a ter interesse em sexo novamente?
O marido concordou, marcou uma consulta e alguns dias depois estava todo fogoso para uma noite de amor com a esposa. Então foi correndo para casa e entrou arrancando as roupas e arrastando a esposa para o quarto. Colocou a esposa na cama e disse para ela:
- Não se mova que eu já volto. Ele foi ao banheiro e voltou logo depois, pulou na cama e fez amor de maneira muito apaixonada como nunca tinha feito com a esposa antes.
A esposa falou:- Zé, foi maravilhoso!
O marido disse novamente para a esposa.
- Não saia dai que eu volto logo. Foi ao banheiro e a segunda vez foi muito melhor que a primeira. A mulher sentou-se na cama, a cabeça girando em êxtase com a experiência.
O Marido disse outra vez: - Não saia dai que eu volto logo. Foi ao banheiro.
Desta vez a esposa foi silenciosamente atrás dele e quando chegou lá o marido olhava para o espelho e dizia:
- Não é minha esposa.
- Não é minha esposa.
- Não é minha esposa.
- Não é minha esposa.
- Não é minha esposa.
- Não é minha esposa.
O velório do Zé será amanhã na capela 13 do cemitério da Saudade!
A-ham" - "Hum-Hum".
Tarde da noite, já estavam deitados, quando a mulher pergunta
Se eu morresse você casava outra vez?
Claro que não, querida!
Não?!
Não por quê?! Não gosta de estar casado?
Claro que gosto!, querida.
Então por que é que não casava de novo?
Está bem, casava...
Casava? (com um olhar magoado)
Casava. Só porque foi bom com você...
E dormiria com ela na nossa cama?
Onde é que você queria que nós dormíssemos?
E substituiria as minhas fotografias por fotografias dela?
É natural que sim...
E ela ia usar o meu carro?
Não. Ela não dirige...
Hum !!!! (silêncio)
Moral da história:
Jamais prolongue um assunto com uma mulher.
Apenas abane a cabeça ou diga "A-ham" ou "Hum-Hum".
ALERTA
de Marília Gonçalves
"Grita filha !
há uma aranha
Na brancura da parede
Que peçonhenta tamanha
Vai tecendo sua rede.
Grita filha !
Essa fobia
É protecção natural
Contra a aranha sombria
Que além de símbolo
é mal !
Grita com todas as forças !
Grita porque há mesmo perigo
Essa aranha uma cruz negra
é o pior inimigo.
Por meu amor não te cales !
Grita filha
Tua mãe
Impele-te pra que fales :
Contigo grito também !
Essa aranha que se estende
Tem o passo marcial
Com fúria que surpreende
O incauto em voz fatal.
Grita filha
O bicho imundo
Sai vertiginosamente
Da sombra vinda do fundo
Em veneno de serpente.
Tal a jibóia medonha
Enrola-se abraça o mundo
Pra ir crescendo em peçonha.
Introduz-se em toda a parte
Tudo corrói e desfaz
É inimiga da Arte
Do Ser Humano da Paz.
Grita filha !
Mas tão alto
Num grito tão verdadeiro
Que desperte em sobressalto
O que não quer ver primeiro.
Essa aranha pestilenta
Odeia a própria Cultura
Em fogueira que alimenta
Livro após livro censura.
Opõe à Humanidade
A sua força brutal
Por onde ela passa invade
Mata o constitucional !
É um monstro repelente :
Primeiro ataca o mais fraco
Para ir seguidamente
Oculta em cada buraco
Destruir a Liberdade.
Inimiga da diferença !
Grita !
Minha filha Grita !
Faz ouvir tua presença.
Aponta o bicho feroz
Mostra-o sacode os amigos
Com a força da tua voz !
Grita !
Esse enredo de perigos !
Grita filha ! Desta vez
Esse grito é racional
Porque essa aranha é o não
Ao direito Universal.
Sem medo abre tua boca !
Grita alto ! Grita forte !
Porque toda a força é pouca
Para lutar contra a morte.
Grita ! Grita minha filha
não te cales nunca mais :
não se veja outra Bastilha
Prendendo os próprios jornais !
Que teu grito seja infindo
Circule dê volta ao mundo
Jovem voz entusiástica
Erguendo o povo profundo
Contra a bandeira suástica."
quinta-feira, 20 de dezembro de 2007
A invenção de Deus
A invenção de Deus
Há aproximadamente 4 mil anos, a idéia de um Deus único e poderoso mudou a história do mundo. Saiba, enfim, como foi criada a idéia do criador
Rodrigo Cavalcante
O todo-poderoso deus do Sol Amon-Rá, um dos criadores do mundo no antigo Egito, não passa hoje de mera curiosidade arqueológica. O mesmo fim levaram outros deuses egípcios, como Osíris e sua mulher Ísis.
Tiamat e Apsu, deuses da criação na Mesopotâmia, também foram relegados ao ostracismo. Zurvan, o deus do tempo na Pérsia antiga, não conseguiu acompanhar o passar dos séculos com a mesma força.
E os grandes deuses gregos e romanos, como Zeus (Júpiter, para os romanos), Afrodite (Vênus) e Apolo (Marte), apesar de gozarem ainda de status literário e mitológico no Ocidente, não são levados mais a sério como divindades. A não ser em episódios de desenhos animados como Os Superamigos, onde ainda são invocados por personagens como o Super-Homem, a Mulher-Maravilha e outros membros da Sala de Justiça.
Mesmo que você seja ateu, Javé continua moldando boa parte de sua vida. Afinal, a imagem de um ser todo-poderoso, masculino, onipotente, pai, permeia a cultura, o comportamento e a ética do Ocidente.
Mas como a idéia de um único deus, cultuado inicialmente por pequenas tribos do Oriente Médio, viria a mudar a história do planeta? Como Javé superou os deuses dos maiores impérios da Antiguidade?
Deuses e Deus
Apesar de ninguém saber ao certo o momento em que os homens passaram a cultuar deuses, a maioria dos arqueólogos e antropólogos concorda que esse é um traço comum de todas as civilizações. Como escreveu a historiadora das religiões Karen Armstrong em seu livro Uma História de Deus, "parece que criar deuses é uma coisa que os seres humanos sempre fizeram. E, quando uma idéia religiosa deixa de funcionar para eles, simplesmente a substituem".
As primeiras imagens de deuses esculpidas em pedras há mais de 10 mil anos na Europa, no Oriente Médio e na Índia em nada se parecem, contudo, com o velho barbudo e musculoso dos afrescos que Michelangelo pintou na Renascença. São imagens de mulheres nuas, gordas, grávidas e de seios fartos que simbolizavam a fertilidade - algo natural, segundo os arqueólogos, numa época em que a agricultura estava se desenvolvendo.
Com o tempo, essa deusa mãe da fertilidade ganharia vários nomes: Inana na antiga Suméria, Ishtar na Babilônia, Anat em Canaã, Ísis no Egito e Afrodite na Grécia. E quase sempre dividia lugar com outros deuses.
Na Grécia antiga, espécie de matriz do mundo ocidental, mais de uma dezena de deuses eram cultuados pelos cidadãos. Nenhum deles, contudo - incluindo o poderoso Zeus - era tão gigante, distante e sobrenatural como o deus da Bíblia.
Para os gregos, os deuses não eram figuras imaculadas e perfeitas, mas apenas uma das "três raças" que habitavam o mundo, ao lado dos animais e dos homens. "Eles eram espécies de super-homens com qualidades e defeitos bem semelhantes aos nossos. Com a diferença, é claro, de que eram imortais", diz o historiador e arqueólogo Pedro Paulo Funari, da Universidade Estadual de Campinas.
Até mesmo a morada deles em nada se assemelha ao céu sobrenatural do deus bíblico. Para os gregos, ao menos 12 desses deuses viviam no monte Olimpo, uma montanha de verdade localizada na Grécia, com quase 3 mil metros de altitude.
E, por estarem mais próximos dos homens, a relação dos gregos com os deuses era semelhante à relação de alguns católicos com seus santos de preferência. Cada um deles tinha um papel bem definido e as oferendas seguiam a lógica das promessas: em troca de ofertas ao seu deus predileto, os devotos esperavam que sua parte no pacto fosse cumprida. Quando isso não acontecia, era comum que os deuses fossem criticados abertamente - assim como um empregado critica seu patrão por não ter retribuído seu esforço.
Adotados pelos romanos com outros nomes, esses deuses da Grécia logo se tornaram parte do ritual cívico do novo império que não parava de se expandir. Como os deuses não eram entidades imaculadas - e sim um tipo de homens superpotentes -, era comum atribuir a alguns imperadores (as pessoas mais poderosas à época) uma origem divina. Na prática, os rituais da administração pública costumavam se mesclar às cerimônias religiosas.
Mas, desde que os povos dominados pelos romanos que seguissem outras religiões pagassem seus impostos e não desafiassem o comando romano, seus cidadãos tinham o direito de seguir os deuses de sua preferência.
Quando os romanos conquistaram a região que hoje faz parte de Israel, no século 1 a.C., eles inicialmente não fizeram muito caso com o culto dos judeus a um deus único no Templo de Jerusalém. Naquele tempo, ninguém podia ainda imaginar que o deus dos judeus seria levado, quatro séculos depois, para o centro do maior império do Ocidente.
Mas que deus era esse?
Deus tribal
Segundo as Escrituras, o pacto entre os judeus e Javé teria começado com um homem chamado Abraão, há cerca de 4 mil anos. Conta a tradição que ele foi chamado por Deus para deixar a cidade de Ur, na Mesopotâmia (atual Iraque), para fundar uma nova nação em uma terra desconhecida.
Mais tarde, essa terra prometida seria chamada de Canaã. Ao obedecer e firmar uma aliança com esse deus único, Abraão recebeu a promessa de que sua "semente" iria prosperar por toda a Terra.
O deus que aparecera para Abraão é completamente diferente dos deuses gregos e romanos. Ele não compartilhava da condição humana e se colocava na posição onipotente de poder fazer qualquer exigência que quisesse. Qualquer uma mesmo.
No caso de Abraão, por exemplo, Javé ordenou que seu filho Isaac fosse sacrificado pelo próprio pai como prova de sua fé. O resto da história é conhecida: no momento em que Abraão já estava com a faca em punho, Javé recuou do pedido e disse que tudo não passara de um teste.
Por isso mesmo, quem lê o Antigo Testamento (o Pentateuco, para os judeus) sabe que Javé não guarda semelhanças com o pai dócil ou amoroso que mais tarde o cristianismo iria propagar. "É um deus brutal, parcial e assassino: um deus de guerra, que seria conhecido como Javé Sabaoth, Deus dos Exércitos", escreveu a historiadora Karen Armstrong. "É passionalmente partidário, tem pouca misericórdia pelos não favoritos, uma simples divindade tribal."
Prova disso seriam as passagens como a que Javé manda pragas aos egípcios. Em outras, Javé se mostra até arrependido de sua criação, como quando ordenou a morte por afogamento de toda a humanidade por meio do dilúvio do qual só escapou a família de Noé e os animais que ele pôs em sua arca - isso antes ainda da aliança feita com Abraão.
Durante essa fase, Javé parece mais preocupado em ameaçar a raça humana para que ela não se desvie de suas instruções. Talvez seja por isso que o pacto de Abraão precisou ser reforçado por outros patriarcas. Caso de Moisés, para quem Deus preferiu escrever diretamente seus mandamentos nas tábuas do profeta, não deixando dúvidas sobre suas intenções.
O fato é que, quando os romanos chegaram a Israel, o deus do Templo de Jerusalém parecia muito mais rigoroso e cheio de exigências que os deuses gregos. Mesmo para os romanos, que admiravam a tradição judaica pela consistência de suas escrituras, a conversão àquele deus era uma tarefa nada fácil.
"Como era necessário seguir uma série de regras, que iam da alimentação à circuncisão, poucos romanos eram atraídos para o judaísmo", afirma o historiador André Chevitarese, professor de História Antiga da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Até que, no século 1, o advento de uma nova seita dentro do judaísmo iria tornar Javé popular muito além das fronteiras de Israel.
Deus cristão
A nova corrente judaica defendia que Jesus de Nazaré, o galileu que acabara de ser crucificado pelos romanos, era o messias enviado por Javé para cumprir as profecias das escrituras. Não seria exagero dizer que, inicialmente, o cristianismo não passava de uma corrente judaica - ou melhor, uma ala do judaísmo, assim como um partido político tem alas que nem sempre estão afinadas com a presidência.
É então que surge uma questão decisiva para o futuro de Jesus e do deus Javé. A pergunta-chave era: os convertidos ao cristianismo que não seguiam os tradicionais rituais judaicos (como a circuncisão) poderiam ser salvos?
Esse foi um dos principais temas discutidos pelos cristãos numa assembléia realizada por volta do ano 49 d.C., mais tarde conhecida pelo nome de Concílio de Jerusalém. Como diz o historiador Paul Johnson em seu livro História do Cristianismo, o tal concílio foi o primeiro ato político da história da Igreja. É aí que surge uma figura decisiva para a expansão do cristianismo e, por tabela, da crença do deus único Javé.
O nome dele era Paulo de Tarso, um homem cosmopolita recém-convertido, para quem os traços judaicos do cristianismo estavam arruinando seu trabalho de arrebanhamento de novos cristãos. Como provavelmente falava grego muito bem e era um dos poucos cristãos que conheciam diversas províncias do Império Romano, ele devia ter consciência das dificuldades que seu trabalho teria caso tivesse que obrigar os gentios a seguirem as práticas judaicas, principalmente a circuncisão.
Para a maioria dos historiadores da religião, se as idéias de Paulo fossem censuradas no Concílio de Jerusalém, talvez o cristianismo permanecesse apenas como mais uma seita judaica, sem conseguir jamais a autonomia responsável pela sua expansão.
Mas a idéia central de Paulo, resumida na frase de que o verdadeiro cristão se justifica pela fé "e não pelos trabalhos da lei", prevaleceu. Os gentios podiam agora se converter sem tantos empecilhos e o cristianismo ganhou novas fronteiras.
"Paulo ajudou a tirar de Jesus a imagem de um messias para o povo hebreu, transformando-o num salvador de todos os povos", diz Chevitarese. Com isso, o deus Javé também deixou de ser um fenômeno regional, ligado apenas ao povo hebreu, para ganhar caráter universal.
Quando, no ano 313, o imperador romano Constantino instruiu os governadores das províncias dominadas por Roma a dar completa tolerância aos cristãos, revogando todos os decretos anticristãos do passado, o cristianismo deu um passo decisivo para se tornar, em seguida, o credo oficial do império.
Com a expansão da nova fé, o deus "carrancudo" ganhou uma face completamente diferente, ao menos para os cristãos. De certa forma, a crucificação de Jesus foi vista como o momento em que Javé sentiu na pele o que é ser humano.
Se, no passado, foi Deus que pediu a Abraão que sacrificasse seu filho como prova de sua fé, o cristianismo invertia essa lógica: agora era o próprio Javé que tivera o filho sacrificado como prova de amor. Mesmo as mensagens atribuídas a Jesus nos Evangelhos parecem ressaltar mais o amor divino que a lei divina.
"Apesar de não ser correta a idéia de que o cristianismo promovera um rompimento total com a tradição judaica, é inegável que a figura de Cristo passa a imagem de um deus bem mais marcadamente amoroso que no passado", diz Luiz Felipe Pondé, filósofo e professor de Teologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
"Na tradição judaica, em que Jesus viveu, estava muito claro que o homem devia temer a Deus acima de tudo. Com Jesus, a mensagem passa a ser amar a Deus acima de tudo."
Deus do Islã
Para os muçulmanos, o acordo firmado entre Javé e Abraão renovou-se e foi ampliado no século 7, quando o mercador Muhammad (em português, Maomé) teria recebido as revelações de Deus (agora, Alá) por meio do anjo Gabriel (para eles, Jibril) - desta feita, em língua árabe. Mais tarde, as revelações foram reunidas no livro sagrado do Islã: o Alcorão (ou recitação, em árabe).
A nova revelação do deus dos judeus e dos cristãos vinha preencher um vazio religioso que há muito perturbava os povos da Arábia. Até então, a região também era um centro de santuários de culto a diversas divindades.
O mais importante desses locais sagrados, em Meca, era a Caaba (que significa "cubo"), e seu objeto especial de veneração era uma pedra preta, fragmento de um meteoro. "Pedras desse tipo eram adoradas pelos árabes nesse tempo em diversas regiões", escreveu o francês Maxime Rodinson na biografia Mahomet, ainda sem tradução no Brasil.
Ao lado da pedra, havia representações de diversas deusas e o santuário era uma espécie de parada obrigatória entre os mercadores da região. Mesmo assim, como escreveu a historiadora Karen Armstrong na biografia Maomé, boa parte dos árabes sentia-se um tanto renegada por nunca ter recebido uma mensagem direta e explícita de um único deus, como as revelações contidas nas sofisticadas escrituras judaicas e nos evangelhos.
Por conhecerem as tradições tanto do judaísmo quanto do cristianismo, eles acreditavam que já era hora de Deus enviar um profeta com uma revelação exclusiva para os árabes. As mensagens recebidas por Maomé foram vistas como o momento em que isso aconteceu.
Para os muçulmanos, as mensagens de Deus contidas no Antigo e no Novo Testamento foram revistas e ampliadas com o Alcorão, que deve ser consultado no lugar das revelações anteriores. No livro sagrado do Islã, o deus de Abraão volta a ser bem mais específico nos seus mandamentos que as parábolas atribuídas a Jesus nos evangelhos.
Nesse quesito, Alá se torna bem mais próximo do deus da Lei do Antigo Testamento (a Torá dos judeus). Entre os 6326 versículos do Alcorão, há desde instruções para o casamento até regras sobre como o governante deve agir na cobrança de impostos.
É provável que esse grau de detalhamento das instruções de Deus seja fruto do momento em que Maomé recebera as revelações. Alá, afinal, transmitiu seus novos mandamentos na época em que o profeta erguia um estado em Meca.
A nova palavra de Deus, contudo, foi tão forte que os seguidores do Islã terminaram construindo um império. Pouco mais de 100 anos após a morte do profeta, seus seguidores levaram a mensagem do deus único para a África e para locais distantes no Oriente, como o Afeganistão e o Paquistão.
A expansão do Islã no último milênio - assim como a do cristianismo - fez com que o deus de Abraão não apenas vencesse a batalha com os outros deuses como também sobrevivesse a um poderoso inimigo: o mundo científico contemporâneo.
Em um tempo em que a narrativa da criação está mais para a explosão caótica do Big Bang do que para o relato do Gênesis, ser ateu continua tão impopular que, como diz o cientista britânico (e ateu) Richard Dawkings, autor de Deus, um Delírio, os homossexuais parecem ter bem mais facilidade para "sair do armário" que os ateus. Quatro mil anos depois, o velho Javé continua em forma.
quarta-feira, 19 de dezembro de 2007
não era maldita?
Por Reinaldo Azevedo
terça-feira, 4 de dezembro de 2007
desovando estoque de sorrisos, hehe
Manuel coloca os óculos e começa a ver todas as mulheres peladas, ele se encanta.
Põe os óculos... Peladas!
Tira os óculos... Vestidas!
- "Que maravilha! Ai Jesus!!!"
E assim foi Manoel para Portugal, louco para mostrar a novidade para a mulher (Maria).
No avião, se sente o máximo vendo as aeromoças todas peladas.
Quando chega em casa, já coloca os óculos para pegar Maria pelada.
Abre a porta e vê Maria e o Compadre no sofá pelados.
Tira os óculos... Pelados!
Põe os óculos... Pelados!
Tira... Pelados!
Põe..... Pelados!
E Manuel diz: -
"Pqp! já quebrou!"
Preocupada com a quantidade de palavrões que o Joãozinho dizia, a mãe
decidiu pedir ajuda ao pastor da igreja.
O pastor deu o seguinte conselho:
- Leve este caderno e anote cada vez que seu filho disser um palavrão. No final do mês, desconte dez centavos por palavra da mesada do menino e os doe para a igreja".
No final do mês, o pastor foi visitar a família e a primeira coisa que fez foi chamar o Joãozinho e conferir o caderno.
Contou os palavrões e disse:
- Meu filho, você proferiu 99 palavrões esse mês!
Isso é terrível!
Sua mãe vai descontar R$ 9,90 da sua mesada.
- Vamos acertar logo isso - disse Joãozinho, sem esconder a irritação. Pegou uma nota de R$ 10,00 do bolso e entregou ao pastor.
O pastor disse: - Eu não tenho R$ 0,10 para te dar de troco ...
E o Joãozinho: - Então, o senhor vai pra puta que o pariu e fica tudo certo.
O negão percebe e fala:
- O que houve cara, por que você desmaiou?
- Desculpe, o que foi mesmo que você disse?
- Ah! Graças a Deus... Eu tinha entendido: FIQUE DE COSTA, seu viado...
O guarda pergunta se ele bebeu.
- Pois é - responde o motorista -
Eu e uns amigos paramos num bar e tomamos uns cinco ou seis chopes. Aí deram um tal de Happy Hour e serviram uma tal de margarita, que era muito boa.
Tomei umas quatro ou cinco.
Aí eu tive que levar o Miguel para casa e acabei tomando duas latas.
Para não ofendê-lo, é claro.
Aí eu parei no caminho de casa e tomei uma garrafa...
O guarda sorri e diz:
- Eu vou ter que pedir para o senhor soprar no bafômetro.
O motorista responde, espantado:
- Por que? O senhor não acredita em mim?
segunda-feira, 3 de dezembro de 2007
PULANDO PELA JANELA
O cara liga pra casa numa tarde para saber o que a esposa vai fazer para o jantar.
- Alô? - diz uma vozinha de criança.
- Oi, querida, é o papai. Mamãe está perto do telefone?
- Não, papai. Ela está lá em cima no quarto com o tio Chico.
Após alguns segundos, o cara diz:
- Mas querida, você não tem um tio chamado Chico!!!
- Sim, eu tenho! E ele está lá em cima no quarto com a mamãe.
- Tá bom, então quero que você faça o seguinte: suba correndo as escadas, bata na porta do quarto e grite para a mamãe e para o tio Chico que meu carro acabou de parar na frente de casa.
- Tá legal, papai.
Alguns minutos depois, volta a menina aos prantos:
- Eu fiz o que você disse, papai.
- E o que aconteceu?
- Bem, a mamãe pulou da cama pelada e começou a correr pelo quarto gritando, tropeçou no tapete e caiu pela janela da frente, e agora ela está
morta...
- Oh, meu Deus!!! E o tio Chico?
- Ele pulou da cama pelado também, estava muito assustado, e pulou
Pela janela do fundo para dentro da piscina, mas ele deve ter esquecido
que você esvaziou a piscina na semana passada para limpar, daí ele bateu a
cabeça no fundo dela, e agora está lá, morto também... Uma longa pausa e o cara diz:
- Piscina???
Por acaso o telefone dai é 3555-0739???
- Não!
- Desculpe, foi engano!!!
"Alice no país das maravilhas" não é uma obra infantil
obra infantil nem infanto-juvenil. Pela sua complexidade de imagens e
metáforas, torna-se difícil para as crianças da atualidade acompanhar os
significados presentes na obra. Para elas, ficam apenas as imagens e as
ações completamente nonsense desenvolvidas por Lewis Carroll. Exemplo disso
é o trecho abaixo, retirado do capítulo 5, pela resposta dada pelo Gato
Sorridente. Muitas vezes a vida nos fornece respostas semelhantes, sem que
possamos nos dar conta disso.
Alice viu que não era possível negar isso. "
Gerhard Erich Boehme
Ler pode tornar o homem perigosamente humano.
Você sabe como capturar porcos selvagens?
O jovem então disse ao professor que era exatamente isso que ele via acontecer neste país. O governo ficava empurrando-os para o comunismo e o socialismo e espalhando o milho gratuito na forma de programas de auxílio de renda, bolsas isso e aquilo, impostos variados, estatutos de "proteção", cotas para estes e aqueles, subsídio para todo tipo de coisa, pagamentos para não plantar, programas de "bem-estar social", medicina e medicamentos "gratuitos", sempre e sempre novas leis, etc, tudo ao custo da perda contínua das liberdades, migalha a migalha.
domingo, 2 de dezembro de 2007
Manoel, Joaquim e a vingança lusa!
Depois de examiná-la, o médico chama o Manoel o e pergunta:
O senhor pratica sexo oral com sua mulher regularmente?
Manuel responde:
- É claro, doutor... Ela gosta muito, pois!
E o médico:
- Então, lembre-se de tirar a caneta de trás da orelha das próximas vezes.
-----------------
Manoel Joaquim dos Santos, nascido em Trás-os-Montes, no extremo, bem extremo, nordeste de Portugal, ganhou seu primeiro lápis de colocar atrás da orelha quando tinha 7 anos.
Aos 15 anos, já no primário, ganhou sua primeira caneta-tinteiro.... de orelha.
Aos 32 anos, descobriu que caneta ambém servia para escrever.
Hoje, já informatizado, está com orelha de abano por causa do peso do mouse.
----------------------
A vingança lusa:
Um brasileiro vivia na Europa e tinha a esposa na maternidade, o filho tinha nascido poucas horas antes. Então ele lá foi para ver o seu rebento, mas, não conhecendo bem a cidade acabou por perder-se.
Apesar disso consegue chegar à maternidade. Chegou a recepção e perguntou:
- Olhe, eu venho cá ver o meu filho, nasceu há algumas horas. Sabe, sou brasileiro e novo na cidade, perdi-me. Ainda posso vê-lo?
- Suponho que possa fazer uma excepção, suba estas escadas a direita e vai lá ter
facilmente.
- Muito obrigado!!
Ele lá foi, subiu as escadas e viu logo um grande letreiro que dizia:
*** Bebés Super Inteligentes e Bonitões ***
Viu uns bebés deitados nos seus berços.
Chegou perto da primeira enfermeira que viu e perguntou muito excitado:
- O meu bebé, quero ver o meu bebé!!
- Pode-me dar o seu nome?
- Sou brasileiro, não devem haver muitos aqui.
- Deixe ver... não, não tenho cá nenhum brasileiro, tente o piso acima.
E subiu as escadas de novo, para encontrar
outro letreiro que dizia:
*** Bebés Inteligentes, Acima do Normal e Bonitos ***
Lá estavam mais bebés nos seus berços e foi perguntar a uma enfermeira se estava lá o seu bebé.
- Não, desculpe mas não temos cá o seu filho, tente o piso acima.
Subindo novamente as escadas e ia embatendo noutro letreiro que dizia:
*** Bebés Com Q.I. Normal e Apresentáveis***
Lá encontrou outra enfermeira a quem perguntou se lá estava o seu adorado filho,
mas obteve a mesma resposta:
- Parece-me que não... Definitivamente não está cá, talvez no piso acima.
Já conhecendo de cor os degraus daquela escada lá foi subindo até encontrar outro
letreiro que por sua vez dizia:
*** Bebés Mais Fracos Intelectualmente e Menos Bonitos ***
Um pouco desiludido, lá foi questionar a enfermeira e foi o mesmo:
- Vai ter que ir lá ver a cima que nós cá não o temos, é só subir...
- Eu sei o caminho, obrigado!
Subindo de novo as escadas encontra outro letreiro que por sua vez diz:
*** Bebés Burros e Feios ***
- Pode ser que seja aqui. Enfermeira, podia-me dizer se o meu filho está aqui?
Depois da procura...
- Terá que ir lá a cima, porque ele aqui não está.
Mais escadas, e mais um letreiro onde está escrito:
*** Bebés Completamente Estúpidos e Feios de Morrer ***
Mais uma enfermeira questionada e a resposta já conhecida:
- Com certeza que está no piso acima, porque aqui não está, desculpe.
Já a pensar que estava no cimo do Hospital vai subindo as escadas, quando vê:
*** Futuros Parasitas e Inadaptados da
Sociedade, Aparência Alienígena ***
- Enfermeira!!
Bla bla bla...
- Como vê aqui há muitíssimos poucos bebés e posso-lhe garantir que aqui não está. Só há mais um piso acima deste e é ai que ele está!
- Ahh, finalmente vou ver o meu filho. Diz o brasileiro enquanto sobe as escadas, onde depara com o seguinte letreiro:
*** Brasileiros ***
ATÉ CRIANÇA SABE
Uma criança de quatro anos em vista ao
grande apelo de marketing do
PANAMERICANO e das Olimpíadas pergunta
para o seu pai.
- Papai o que é PARAOLIMPIADAS?
O pai, com habilidade responde ao pequeno
ser:
- Assim como tivemos o PAN, PARAPAN,
teremos as Olimpíadas e as PARAOLIMPÍADAS.
As PARAOLIMPÍADAS são para os atletas
especiais, com deficiência física, mentais,
entendeu filhinho?
- Ah papai, entendi. Assim como teve eleição
"PARAPRESIDENTE" e o LULA GANHOU NÉ?
Devido ao grande número de cearenses aderindo ao que os mineiros de Governador
Valadares já fazem há muito tempo, ou seja, se mandar para os "States", o governo do
Ceará mandou fazer uma pequena cartilha traduzindo algumas expressões básicas
usadas no dia a dia, para ajudar os conterrâneos nas previsíveis dificuldades
iniciais num país estrangeiro. Vamos lá:
What the hell is that? = Diabéisso?
Hurry up! = Avua, homi!
Take it easy! = Se avexe não!
Don´t be stupid! = Deixe de ser jumento!
Let´s go, fellows! = Rumbora negada!
No thanks! = Carece não!
Very far away! = Lá na carraducarai!
Very good = Danado de bom.
This way = Peralí.
More or less = Marromeno.
Straight ahead = No rumo da venta.
Get out of the way = Ó, sai do mei!
That´s cool! = É pai d´égua!
I give up! = Eu peço penico!
Wait for me! = Perainda!
Hey, mister! = Psiu, ei seu Zé!
Son of a bitch = Fi duma égua.
Come to me, baby! = Ande, Tonha!
O ginecologista tirou um dia de folga e foi para a praia.
Uma gata muito gostosa também foi para tomar banho de sol.
Numa certa hora ela resolveu entrar na água, mas quando estava entrando, veio uma onda muito grande e tirou todo o seu biquíni.
Ela coloca seu braço tampando seus seios, pega um côco e tampa a perereca.
Sai de fininho para ninguém ver, mas o ginecologista fica olhando.
A gostosa já com raiva esbraveja:
O que está olhando? Nunca viu não?
Ver eu já vi muitas, mas tomando água de côco é a primeira vez.
Fada Madrinha
Era uma vez um casal que fazia bodas de prata e estava também celebrando os seus 60 anos de idade.
Como prêmio por terem sido um casal exemplar durante 25 anos, concederei um desejo a cada um!
Quero fazer uma viagem ao redor do mundo com o meu querido marido!
-Pediu a mulher. A fada moveu a varinha e... zás!
Os bilhetes apareceram nas mãos da senhora.
Em seguida foi a vez do marido.
Ele pensou um momento e disse:
Bem, este clima está muito romântico, mas uma oportunidade destas só se tem uma vez na vida.
Então... Bom, desculpa, amorzinho -disse, olhando para a esposa - mas o meu desejo é ter uma mulher trinta anos mais jovem do que eu!
A mulher fica chocada, mas pedido é pedido:
A fada faz um circulo com a varinha e... zás!
O homem ficou com 90 anos!
Moral da história:
Todos os homens são sacanas, mas as fadas madrinhas são mulheres!
A MULHER E A PÉROLA
A cena desta piada se passa num templo Shaolin.
O discípulo:
Sábio e honrado mestre, poderia ensinar-me a diferença entre uma pérola e uma mulher?
O Mestre:
A diferença, humilde gafanhoto, é que numa pérola pode-se enfiar por dois lados, enquanto numa mulher somente por um lado.
O discípulo (um tanto confuso):
Mas Mestre, longe de mim pensar contradizer vossa himalaiana sabedoria, mas ouvi dizer que certas mulheres permitem ser enfiadas pelos dois lados!
O Mestre (com um fino sorriso):
Nesse caso, curioso gafanhoto, não se trata de uma mulher e sim de uma pérola ....
Joãozinho na escola
Joãozinho estava na escola quando o professor pergunta:
- Joãozinho, quanto é dois e dois?
- É relativo, professor, porque se os números estão na horizontal é 22, se estão na vertical é 4.
- Ah... Pensas que és muito inteligente, não Joãozinho?
Pensas que és um sabichão, neh? Agora diz-me, quantos são os mandamentos de Deus?
- Os mandamentos são... Bem, é relativo, professor.
- Como é que é relativo!!!??
- É relativo, porque se são para homens são 10, mas se são para mulheres são 9, porque as mulheres não podem desejar a mulher de próximo, a menos que sejam lésbicas.
- És um filho da p(*), Joãozinho!
- Também é relativo, professor, porque se na realidade sou filho de minha mamãe, NÃO; mas se sou filho da sua, então SOU!
COMPRE UM BILHETE E CONCORRA A 2 PICK UPs ZERINHAS!
O garoto pensou: - 'Eu poderia ganhar esses 2 carros! E deixar meu pai com um carro e dinheiro sobrando'
Então com o dinheiro das contas comprou vários bilhetes.
Chegou em casa, desviou-se do pai, nem jantou, e foi logo deitar.
No outro dia, logo cedo, o pai preocupado com a conta, ao acordar, pergunta ao filho pelas contas pagas. Então o filho lhe respondeu que havia comprado os bilhetes e que daqui dois dias o pai iria ganhar duas camionetes. O pai ficou uma fera! Ficou doidão, esbravejou porque aquele era o último dinheiro que tinha e teria para pagar as contas e como se não bastasse, a bronca, deu uma bela de uma surra em seu filho.
Passados dois dias, chegou o dia do sorteio e então...
S U R P R E S A!!!!!!
Ao acordar, a família teve uma surpresa, estavam estacionados em frente à casa:
Duas camionetes novinhas !
Todos ficaram emocionados e começaram a chorar !
Uma era da Sabesp e outra da Eletropaulo.
Cortaram a luz e a água por falta de pagamento.
Vai acreditando que dinheiro cai do céu e pare de trabalhar... vai...!
Pobre Juvenal
Juvenal tava desempregado há meses. Com a resistência que só os brasileiros têm, o Juvenal foi tentar mais um emprego em mais uma entrevista. Ao chegar no escritório, o entrevistador observou que o candidato tinha exatamente o perfil desejado, as virtudes ideais e lhe perguntou:
- Qual foi seu último salário?
- 'Salário mínimo', respondeu Juvenal.
- Pois se o Sr. For contratado ganhará 10 mil dólares por mês!
- Jura?
- Que carro o Sr. Tem?
- Na verdade, agora eu só tenho um carrinho pra vender pipoca na rua e um carrinho de mão!
- Pois se o senhor trabalhar conosco ganhará um Audi para você e uma BMW para sua esposa! Tudo zero!
- Jura?
- O senhor viaja muito para o exterior?
- O mais longe que fui foi pra Belo Horizonte, visitar uns parentes...
- Pois se o senhor trabalhar aqui viajará pelo menos 10 vezes por ano, para Londres, Paris, Roma, Mônaco, Nova Iorque, etc.
- Jura?
- E lhe digo mais... O emprego é quase seu. Só não lhe confirmo
agora porque tenho que falar com meu gerente. Mas é praticamente garantido. Se até amanhã (sexta-feira) à meia-noite o senhor NÃO receber um telegrama nosso cancelando, pode vir trabalhar na segunda-feira.
Juvenal saiu do escritório radiante. Agora era só esperar até a
meia-noite da sexta-feira e rezar para que não aparecesse nenhum maldito telegrama.
Sexta-feira mais feliz não poderia haver.
E Juvenal reuniu a família e contou as boas novas. Convocou o bairro todo para uma churrascada comemorativa a base de muita música. Sexta de tarde já tinha um barril de choop aberto. As 9 horas da noite a festa fervia. A banda tocava, o povo dançava, a bebida rolava solta. Dez horas, e a mulher de Juvenal aflita, achava tudo um exagero. A vizinha gostosa, interesseira, já se jogava pra perto do Juvenal. E a banda tocava! E o choop gelado rolava! O
povo dançava!
Onze horas, Juvenal já era o rei do bairro. Gastaria horrores para o
bairro encher a pança. Tudo por conta do primeiro salário. E a mulher resignada, meio aflita, meio alegre, meio boba, meio assustada.
Onze horas e cinqüenta e cinco minutos........ Vira na esquina
buzinando feito louco uma motoca amarela... Era do Correio! A festa parou! A banda calou! A tuba engasgou! Um bêbado arrotou! Uma velha peidou! Um cachorro uivou!
Meu Deus, e agora? Quem pagaria a conta da festa?
- Coitado do Juvenal! Era a frase mais ouvida.
Jogaram água na churrasqueira! O chopp esquentou! A mulher do Juvenal desmaiou! A motoca parou!
- Senhor Juvenal Batista Romano Barbieri?
- Si... si... sim, so... so... sou eu...
A multidão não resistiu...
- OOOOOHHHHHHHHHHH!!!!!!!!!!!
- Telegrama para o senhor...
Juvenal não acreditava... Pegou o telegrama, com os olhos cheios
d'água, ergueu a cabeça e olhou para todos.
Silêncio total !!! Respirou fundo e abriu o telegrama. Uma lágrima
rolou, molhando o telegrama.. Olhou de novo para o povo e a consternação era geral.
Tirou o telegrama do envelope, abriu e começou a ler. O povo em
silêncio aguardava a notícia e se perguntava.
- E agora? Quem vai pagar essa festa toda?
Juvenal recomeçou a ler, levantou os olhos e olhou mais uma vez para o povo que o encarava...
Então, Juvenal abriu um largo sorriso,
deu um berro triunfal
e começou a gritar,
super alegre e eufórico:
- Mamãe morreeeeuuu! Mamãe Morreeeeuuu!!!!!!!
Tênis e Frescobol / Rubem Alves
Depois de muito meditar sobre o assunto concluí que os casamentos (relacionamentos) são de dois tipos: há os casamentos do tipo tênis e há os casamentos do tipo frescobol.
Os casamentos do tipo tênis são uma fonte de raiva e ressentimento e terminam sempre mal. Os casamentos do tipo frescobol são uma fonte de alegria e têm a chance de ter vida longa.
Para começar, uma afirmação de Nietzche, com a qual concordo inteiramente: "Ao pensar sobre a possibilidade do casamento cada um deveria se fazer a seguinte pergunta: Você crê que seria capaz de conversar com prazer com esta pessoa até sua velhice?
Tudo o mais no casamento é transitório, mas relações que desafiam o tempo são aquelas construídas sobre a arte da conversa". Scherazade sabia disso. Sabia que os casamentos baseados nos prazeres da cama são sempre decapitados pela manhã e, terminam em separação, pois os prazeres do sexo se esgotam rapidamente, terminam na morte, como no filme O Império dos Sentidos.
Por isso, quando o sexo já estava morto na cama, e o amor não mais se podia dizer através dele, ela o ressucitava pela magia da palavra: começava uma longa conversa sem fim, que deveria durar mil e uma noites. O sultão se calava e escutava as suas palavras como se fossem música. A música dos sons ou da palavra - é a sexualidade sob a forma da eternidade: é o amor que ressuscita sempre, depois de morrer.
Há os carinhos que se fazem com o corpo e há os carinhos que se fazem com as palavras. E contrariamente ao que pensam os amantes inexperientes, fazer carinho com as palavras não é ficar repetindo o tempo todo "Eu te amo...".
Barthes advertia: "Passada a primeira confissão, 'eu te amo' não quer dizer mais nada." É na conversa que o nosso verdadeiro corpo se mostra, não em sua nudez anatômica, mas em sua nudez poética. Recordo a sabedoria de Adélia Prado: "Erótica é a alma"!
O tênis é um jogo feroz. O seu objetivo é derrotar o adversário. E a sua derrota se revela no seu erro: o outro foi incapaz de devolver a bola.Joga-se tênis para fazer o outro errar. O bom jogador é aquele que tem a exata noção do ponto fraco do seu adversário, e é justamente para aí que ele vai dirigir sua cortada - palavra muito sugestiva - que indica o seu objetivo sádico, que é o de cortar, interromper, derrotar. O prazer do tênis se encontra portanto, justamente no momento em que o jogo não pode mais continuar porque o adversário foi colocado fora de jogo. Termina sempre com a alegria de um e a tristeza de outro.
O frescobol se parece muito com o tênis: dois jogadores, duas raquetes e uma bola. Só que para o jogo ser bom, é preciso que nenhum dos dois perca. Se a bola veio meio torta, a gente sabe que não foi de propósito e faz o maior esforço do mundo para devolvê-la gostosa, no lugar certo, para que o outro possa pegá-la. Não existe adversário porque não há ninguém a ser derrotado. Aqui ou os dois ganham ou ninguém ganha. E ninguém fica feliz quando o outro erra - poiso que se deseja é que ninguém erre. O erro de um, no frescobol é como ejaculação precoce: um acidente lamentável que não deveria ter acontecido, pois o gostoso mesmo é aquele ir e vir, ir e vir, ir e vir... E o que errou pede desculpas, e o que provocou o erro se sente culpado.
Mas não tem importância: começa-se de novo este delicioso jogo em que ninguém marca pontos... A bola: são nossas fantasias, irrealidades, sonhos sob a forma de palavras. Conversar é ficar batendo sonho pra lá, sonho pra cá... Mas há casais que jogam com os sonhos como se jogassem tênis. Ficam à espera do momento certo para a cortada.
Tênis é assim: recebe-se o sonho do outro para destruí-lo, arrebentá-lo, como bolha de sabão... O que se busca é ter razão e o que se ganha é o distanciamento. Aqui, quem ganha sempre perde.
Já no frescobol é diferente: o sonho do outro é um brinquedo que deve ser preservado, pois se sabe que, se é sonho, é coisa delicada, do coração.
O bom ouvinte é aquele que, ao falar, abre espaços para que as bolhas de sabão do outro voem livres. Bola vai, bola vem - cresce o amor ... Ninguém ganha, para que os dois ganhem. E se deseja então que o outro viva sempre, eternamente, para que o jogo nunca tenha fim...
Rubem Alves
quinta-feira, 7 de junho de 2007
GLOBALIZAÇÃO
E A NOVA ORDEM MUNDIAL
José Osvaldo de Meira Penna
A globalização é um fato. É o fenômeno mais evidente da modernidade, um processo que já conta com meio milênio de duração, uma evolução irreversível resultante dos descobrimentos e extraordinários avanços tecnológicos da humanidade a partir do período da Renascença. Podemos datar a globalização, se quiserem, dos fins do século XV quando portugueses e espanhóis se lançaram "por mares nunca dantes navegados", enquanto Copérnico e Galileu propunham uma teoria heliocêntrica que confirmava a redondeza da Terra e estendia infinitamente os limites do Universo. Desde então, o processo tem avançado a passos de gigante.
Podemos, no entanto, recuar mais ainda. No Cristianismo encontramos, pela primeira vez bem definida, a tese da unidade da espécie humana. Quando anunciam os Evangelhos que a missão dos apóstolos é de estender a “Boa Nova” até os limites do universo e quando, em suas Epístolas, declara São Paulo que não há judeu, nem grego, nem escravo, nem senhor, nem homem, nem mulher, circunciso ou incircunciso, bárbaro ou scita – “pois todos vós sois um só em Cristo Jesus” (Galatas 3:28 e Colossenses 3:11) – está, na realidade, pregando a superação de toda religião nacional, como eram ainda as crenças pagãs e o próprio Judaísmo, em favor de uma fé de âmbito católico no sentido literal do termo (do grego kath holon, “em geral” ou “universal”). O Cristianismo pode ser definido como uma religião “universal” nesse significado estrito. A Igreja católica nunca pretendeu o contrário, ainda que alguns padres, mal informados, condenem hoje a “globalização”. A idéia, aliás, brotou no próprio Estoicismo dos primeiros séculos de nossa era em Roma – então no apogeu de sua glória e poder. Quando o Imperador Marco Aurélio meditou a frase célebre: “Diz o poeta, cara Cidade de Cecrops; mas não dirias, Cara Cidade de Zeus?”, queria indicar a dualidade das Cidades, a nacional e a universal. Caracala, pouco depois, estenderia a cidadania romana a todos os habitantes livres do Império e Agostinho formularia transcendentalmente a mesma imagem na Cidade de Deus, que se sobrepõe às várias cidades terrenas.
O processo histórico de expansão planetária vale-se de um longínquo testemunho concreto quando, por volta da época de Trajano em princípios do segundo século de nossa era, as vanguardas de uma legião romana surpreenderam na longínqua Bactriana – ou seja, no que é hoje o Turcomenistão e norte do Afeganistão, abaixo do Hindu Kush – unidades avançadas do exército chinês. O fato é que, naquela única vez antes da modernidade, o Império Romano, o Ocidente, e o Império Chinês da dinastia Han, o Oriente, cobriam sua máxima extensão a ponto de se tocarem. Dois episódios notáveis permaneceram desse momentoso encontro. Através de um reino grego remanescente das conquistas de Alexandre, na Bactriana, que se havia convertido ao Budismo, a influência da estatuária grega se fez sentir sobre a arte budista da China e do Japão – contribuindo para a própria ligação da Índia, onde nascera a doutrina do Buda Gautama, com a Ásia Oriental onde prosperou essa religião. O Tibet é um laço comum entre a China e despencaram nas Grandes Invasões, derrubando o Império Romano a partir do quarto século de nossa era. Sob a liderança de Átila, os próprios hunos entraram na carniça. Em suma, o mundo já se globalizava muito antes de saber em que consiste a globalização. Outros fenômenos históricos contribuíram para o movimento planetário, como a expansão dos polinésios pelo Pacífico e dos wiquingues pelo Atlântico Norte, ambos em direção à América do Norte, tudo isso séculos antes da viagem de Colombo.
O grande fator de união da Eurásia foi, no entanto, representado pela conquista mongol. No século XIII, os vários impérios edificados pelos descendentes de Genghiz Khan, dominando da China até o Oriente Médio e da Mongólia até a Rússia, criaram condições que permitiram ao mercador veneziano Marco Polo atingir Kambalig, isto é, Peking (Beidjing). Antes dele, um monge franciscano, Giovanni da Piano Carpini, visitou a corte do Grande Khan para convencê-lo, em nome do Papa, a abster-se de invadir a Europa e a aliar-se com os Cruzados para uma ofensiva conjunta contra os mahometanos. Bagdad seria, pouco depois, destruída. Contudo, a conquista definitiva de um mundo ecumênico só principiou com os Grandes Descobrimentos, marcados por quatro etapas relevantes: a viagem de Colombo, dado como havendo “oficialmente” descoberto a América; a de Vasco da Gama que abriu o caminho da Índia e se prolongou, subsequentemente, com a chegada dos primeiros missionários e comerciantes europeus à China e ao Japão; a “descoberta” do Brasil por Pedro Alvares Cabral que associou nosso país ao movimento marítimo de extensão global da civilização européia; e a circunavegação do planeta pela esquadra de Fernão de Magalhães. Daí para a frente, o movimento se acentuou até culminar no século XIX. Em relação à China,. capítulos importantes foram a embaixada levada a efeito por Lord Macartney à corte do último grande imperador da dinastia mandchú em Peking (1794), embaixada que fracassou mas foi seguida, poucos anos depois, pela abertura forçada dos portos chineses após a chamada “guerra do ópio”, sendo Hong-Kong e Xanghai fundadas na ocasião. O outro capítulo foi a viagem do comodoro Perry que, em 1853, obteve sob a ameaça de seus canhões a abertura do Japão, desencadeando a “Restauração Meiji” – com a modernização sob a liderança do Mikado. A colonização da África, também no século XIX, e o acabamento da exploração do planeta em nosso próprio século (Polo Norte, Polo Sul, Monte Everest, Amazônia) terminam o que poderíamos denominar a “globalização geográfica” do mundo.
A idéia de “um Mundo Só”, em termos políticos, tem uma longa história. Ela é marcada pelo ensaio de Kant, de 1784, sob o título “Idéia para uma História Universal do Ponto de Vista Cosmopolita”. E, em 1919, o Presidente Wilson apoia a idéia de fundação da Liga das Nações que não se torna universal porque o próprio Senado americano se recusa a ratificar o Pacto que cria a organização. Em 1940, o candidato republicano contra a reeleição de Roosevelt, Wendell Wilkie, lança o slogan “Um Só Mundo”. Mas é o próprio Roosevelt que, com Churchill, concebem a Organização das Nações Unidas na Carta do Atlântico de Janeiro de 1942. A esta aderem, antes do fim da guerra, 46 nações “aliadas”, entre as quais o Brasil. Não me estenderei em relação à ONU, arremedo talvez prematuro de um governo mundial, sendo seu fim precípuo o de manter a paz e a segurança internacional, evitando novas guerras. Esses objetivos só têm sido parcial e confusamente alcançados pela Organização – que se justifica, entretanto, como cenáculo de debates na expressão dos anseios da opinião pública mundial.
Um ponto importante merece, a esta altura, ser destacado. Contrariamente à falsa idéia que prosperou entre nós, particularmente na Esquerda, não foi Karl Marx um adversário mas um entusiástico propugnador da idéia de globalização. No Manifesto Comunista de 1848, Mar e Engels declaram taxativamente: “Mediante a exploração do mercado mundial, a burguesia tem dado um caráter cosmopolita à produção e ao consumo de todos os países. Com grande mágoa dos reacionários, ela puxou de sob os pés da indústria a base nacional onde se sustentava. As antigas indústrias nacionais foram destruídas ou estão sendo continuamente destruídas. São suplantadas por outras indústrias cuja introdução se converte em questão vital para todas as nações civilizadas; por indústrias que já não empregam matéria prima indígena mas matérias-primas oriundas das regiões mais longínquas do mundo; indústrias cujos produtos não só se consomem no próprio país mas em todas as partes do mundo. No lugar das antigas necessidades, satisfeitas com produtos nacionais, surgem necessidades novas que reclamam, para sua satisfação, produtos dos países mais afastados e dos clientes mais diversos. No lugar do antigo isolamento e da autarquia das regiões e nações, se estabelece um intercâmbio universal, uma interdependência universal das nações. E isso se refere tanto à produção material quanto à intelectual. A produção intelectual de uma nação se converte em patrimônio comum de todas. A estreiteza e o exclusivismo nacionais tornam-se cada vez mais impossíveis; e a partir das numerosas literaturas nacionais e locais se forma uma literatura universal”. Chamo particularmente a atenção par as frases sublinhadas. Marx obviamente considera irreversíveis globalização e interdependência. Em várias outras obras e nos artigos que escreveu para jornais ingleses e americanos essa mesma idéia de internacionalização da economia, acompanhada pela globalização da cultura, são enfatizadas pelo fundador do comunismo, idéia que é desenvolvida por seus epígonos até o final do século. Os termos são inconfundíveis. Marx concedia seus méritos à "classe burguesa", embora o fenômeno nada devesse ao preconceito de "luta de classes".
Em suma, o que muitos marxistas tupiniquins ignoram é que o velho guru barbudo era globalista, entusiasticamente globalista, pois acreditava que só uma economia capitalista madura criaria as condições indispensáveis à revolução proletária. A prova da ignorância está numa polêmica ocorrida em 1998, entre dois eminentes cartolas do PT, os deputados José Genoíno e Sandra Starling, líder do partido na Câmara. Por coincidência, comemorava-se, então, o sesquicentenário do Manifesto de Marx/Engels. Refiro-me a esse episódio para demonstrar quanta bossalidade ainda cerca as manifestações da intelectuária de Esquerda em nossa terra. Desconhecendo com toda evidência os escritos de seu mestre, Sandra Starling deblaterou contra a globalização, considerando-a contraditoriamente como um mito, uma ilusão falsa, uma perspectiva errônea e, ao mesmo tempo, uma realidade apocalíptica cujos efeitos perversos passou a enumerar em tons histéricos. Seu colega Genoíno, mais genuinamente marxista, compreendeu as implicações das teses de Marx para uma interpretação correta do que se passa hoje no mundo.
O estupendo paradoxo é que as profecias de Marx, que se esboroaram totalmente no que diz respeito à sua tese do triunfo inevitável do socialismo sob o efeito das Leis Férreas da História - revelaram-se uma antecipação realista no que diz respeito à universalização da Cultura ocidental. A luminosa realidade no texto básico do Marxismo é que é ela atribuída, justamente, à burguesia capitalista. O paradoxo é que seja exatamente a globalização o que hoje detestam os esquerdistas, não em termos de um arrazoado econômico e social, mas por força de irresistíveis paixões nacionalistas.
A interdependência inevitável das nações é o que “a artilharia pesada” do Manifesto de 1848 anuncia, com a qual o capitalismo está “destroçando as Muralhas da China”, forçando assim, nas próprias palavras de Marx, “a capitulação do intenso e obstinado ódio dos bárbaros contra os estrangeiros”. Mas, me pergunto então: quem são hoje “os bárbaros mais obstinados”? Não seriam os de Cuba e da Coréia do Norte, os dos dois últimos baluartes da reação vermelha - os mais isolados, os mais economicamente “independentes” e os mais miseráveis? A extrema ternura e cega adoração que os esquerdistas de todo o mundo, particularmente brasileiros, que somos tão emotivos, dedicam a personalidades como o do “queridíssimo Fidel” (como assim a ele se endereçou o ex-cardeal arcebispo de São Paulo), não possui explicação racional. Irracional, na verdade, é a curiosa simpatia que, em nossos meios de comunicação, despertam personalidades exóticas do tipo de Fidel, Saddam Hussein e Slobodan Milosevitch – talvez porque se posicionem como machões ou heróicos Davids que ousam desafiar o Grande Satã do Tio Sam.
Outro exemplo é a criação, num nível mais sofisticado e francamente acadêmico, de um curioso revisionismo em matéria de história pátria. Subitamente, ao invés de vilão, surge Francisco Solano Lopez como herói da luta contra a Dependência e a Globalização. O Paraguai daquela época, de Francia e Solano Lopez, havia, efetivamente, alcançado um prodigioso estágio de crescimento autárquico e fora transformado, por seus três ditadores sucessivos, numa espécie de Prússia sul-americana, solitária, orgulhosa e agressivamente auto-suficiente: uma verdadeira autarquia com um certo vezo teocrático jesuítico. Na interpretação marxista com que os neo-historicistas patrícios pretendem exaltar essas figuras, longe de ser responsável pela guerra total que o arruinou em meados do século passado, o Paraguai, produto do coletivismo jesuítico das Missões de Guaira, foi vitima do Imperialismo britânico, agindo por intermédio do sub-imperialismo brasileiro. Que objetivos esses “imperialismos” procuravam alcançar, eis o que esses brilhantes e ilibados pesquisadores jamais condescendem a nos explicar. Mas enfim: deixai-os sonhar em suas grotescas fantasias autárquicas...
Marx não previra, contudo, o papel monstruoso do Estado. Pensara que fosse apenas o Comitê Diretor da burguesia – destinado à supressão pelo proletariado, uma vez vitoriosa a Revolução. Ora, é precisamente esse Estado, cujo crescimento patológico os liberais procuram deter, o que se transformou no patrimônio de uma Nomenklatura egoísta que sobrevive pela fraude sob o rótulo de defesa da “justiça social”... A verdade é que nenhum dos grandes maîtres à penser da primeira metade do século havia pensado na problemática do Estado-nação soberano, quando essa questão crucial forçosamente se levanta ao falarmos de Globalização. Um único economista da época, quase absolutamente desconhecido, previu e preveniu quanto aos aspectos ominosos do problema. Foi Friedrich Hayek que, em 1944, publicou um livrinho sob o título “O Caminho da Servidão”, para provar que o crescimento do Estado interventor e o controle crescente da economia pelos políticos e os burocratas conduziria, inevitavelmente, ao Totalitarismo, esse mesmo contra os quais os Aliados ocidentais estavam então combatendo.
Depois do colapso do comunismo no Annus Mirabilis de 1989, alguns liberais acreditaram que suas idéias haviam definitivamente triunfado. A própria história alcançara seu fim. Esqueceram que não somente a história nunca, presumivelmente, terá fim mas que as contradições entre os homens vivendo em sociedade, embora podendo mudar de aspecto, jamais cessarão. Passaram-se dez anos. A crise financeira na Ásia e na nação que, paradoxalmente, fora o sustentáculo máximo do Marxismo, ressuscitaram o cadáver da Ideologia que, na mente das Viúvas inconsoláveis da Praça Vermelha, se transformou, como anunciava o Manifesto, num espectro. Mas um espectro que, não a nós, liberais, mas a eles sobressalta. A crise é financeira. Ela atinge valores abstratos, câmbio, investimentos, meios de pagamento que, por força da automação e da Informática, provocam desemprego exatamente nos países cujos governos não souberam manobrar adequadamente as regras do mercado competitivo. A própria crise e o sucesso recente de partidos cor-de-rosa na França, Inglaterra e Alemanha, reacendeu-lhes as esperanças utópicas. O “pensamento desiderativo” (wishful thinking) pode manifestar-se de maneiras surpreendentes: desde o grito do notório ressentido, “A Crise é o Muro de Berlim do Capitalismo!”, até a distorção mais sutil como quando a imprensa brasileira anuncia a vitória dos democratas nas eleições americanas ao passo que, na verdade, ocorreu apenas uma pequena redução da absoluta maioria republicana na Câmara, sem afetar seu triunfo no Senado e em 32 dos 50 governos estaduais dos USA.
A extraordinária capacidade dos intelectuais de estilo neo-burro, como os chamava Gustavo Franco, de se auto-iludirem, pode ser aquilatada por três fatos decisivos que procuram ignorar. O primeiro é que a economia do grande bicho-papão, os USA, se encontra em franca e inédita prosperidade, criando três milhões de empregos e absorvendo dois milhões de imigrantes por ano, precisamente no momento em que as economias semi-socializadas da Europa registam altos índices de desemprego, em conjunção com a presença de uma pesada massa indesejável de clandestinos árabes, africanos, turcos, iugoslavos e refugiados políticos, vegetando na economia informal.
Numa incoerência semelhante parecem incorrer os que associam globalização e neoliberalismo como expressões "pósmodernas" da intervenção do demônio na história. Mas será que se dão conta do que aconteceria se, por ato ou boato de algum arcanjo ou espírito sobrenatural - encarnações tardias das masturbações mentais de Rousseau - pudesse o Brasil trancar-se dentro de suas fronteiras como autarquia absoluta, terreno fértil para a ideologia jingo-chauvinista que tanto prezam? Pois, que é o Brasil senão um dos produtos mais autênticos, num mercado aberto de coisas, de idéias e de pessoas, da extensão global dos conhecimentos, dos transportes, das comunicações e do comércio que se desenvolve desde 1500? Que é o Brasil, em outros termos, senão um dos mais belos expoentes da globalização? Do exterior, do mundo global vieram portugueses, africanos e outros imigrantes, entre os quais, presumo, os ancestrais daqueles que me estão lendo. Do exterior vieram, e continuam sendo importados os apetrechos tecnológicos que permitem ao Brasil ser hoje uma potência média em desenvolvimento, todos repito: aviões, automóveis, telefones e eletricidade, canhões, fuzis, tanques e navios, computadores e aparelhos de televisão, medicina, remédios, higiene, técnicas de controle da natalidade e tratamento odontológico, economia industrial, sistema monetário de troca, capitais e investimentos diversos, modelos de regimes políticos, constituições e ideologias. Vieram, em suma, língua, livros, filosofia, religião, quase toda a cultura e conselhos de bom senso... que outra coisa mais desejam? A globalização pode nos conduzir a um planeta sem fronteiras. Pode integrar-nos em áreas mais extensas de convivência pacífica - como está acontecendo na Europa e, timidamente, com nossos vizinhos platinos, graças a Deus! E ela exige uma língua comum, como foi, outrora, o latim e depois o francês.
É possível, entretanto, que um único governo mundial venha ainda a ser, como pensam os angustiados, um sonho prematuro ou, pelo contrário, um pesadelo horroroso. Todavia, é mister que haja instituições, tanto nacionais quanto internacionais, que combatam fenômenos que, esses também, não conhecem fronteiras. as epidemias, as catástrofes ecológicas, a criminalidade em geral, pública e privada. Ninguém falou, por enquanto, num único governo mundial. Mas que há necessidade de uma nova "organização internacional" - isto é, "entre as nações" - eis que não se trata de uma utopia, mas de um Grande Projeto bem-vindo pelas pessoas de bom senso. Afinal de contas, estamos terminando um século atormentado em que milhões de seres humanos morreram e continuam morrendo, estupidamente, em guerras mundiais, guerras regionais, guerras civis e guerrilhas, pelo efeito perverso das ideologias que nos desgraçaram e que, todas elas, pregavam a exaltação grosseira dos símbolos do coletivismo fechado.
As ciências sociais raramente se têm associado com a filosofia política e a historiografia para estudar o fenômeno desse massacre coletivo, resultante de regimes totalitários e tiranias personalistas. Há um número considerável de livros publicados sobre o Holocausto judaico da IIa Guerra Mundial; sobre a criminalidade no mundo; sobre os males do colonialismo e outros no gênero. O professor R.J. Rummel, cientista político da Universidade de Hawai, se distingue pelo trabalho gigantesco e obsessivo que tem realizado, com a publicação de já quatro livros sobre os genocídios ou o que ele chama os "democídios" de nossa centúria. Esta, como se sabe, é notória por haver avançado a cultura humana no salto mais espantoso do conhecimento científico e desenvolvimento tecnológico e econômico, mas também de ser responsável pelo morticínio inédito na história da Humanidade. Rummel não está tanto interessado nas mortes em conflitos bélicos que qualificaríamos de "normais" - como os oito milhões de soldados mortos diretamente em combate na Ia Guerra Mundial. Sua pesquisa se dirige ao massacre puro e simples de civis, prisioneiros de guerra, refugiados em trânsito, mortos em campos de concentração e de outros modos eliminados, numa variedade de formas que deixa os diversos torturadores e inquisidores da Idade Média como suaves sadistas em comparação. O número de mortes por violência coletiva em nosso século atinge facilmente 200 milhões. Rummel calcula em 170 milhões apenas os mortos em democídios, excluindo os soldados na guerra. Ele estabelece uma lista dos mega-assassinos que é a seguinte, com as respectivas cifras de sua vítimas (em milhões): URSS (62); China comunista (35) com mais 3,5 no período da guerra civil e guerrilha; Alemanha nazista (21); China nacionalista e período de anarquias militar(11); Japão (6); Cambódia (2); Turquia (1,8); Vietnam (1,7); Polônia e Tchecoeslováqauia (1,6 no episódio da expulsão dos alemães em 1944/45); Paquistão (1,5); Iugoslávia (um milhão) tanto por parte dos Titoístas quanto Croatas e Sérvios; Coréia do Norte (1,6) e México (1,4) no período da Revolução mexicana. Alguns outros episódios foram, infelizmente, esquecidos pelo eminente historiador detetive: os milhões resultantes dos regimes comunistas da Etiópia (Menguistu) e Angola; assim como os milhões resultantes da partilha do sub-continente indiano, inclusive constantes conflitos comunais. Cifras de algumas centenas de milhares de vítimas poderiam também ser registadas em "la violência" na Colombia e nas guerras coloniais da Inglaterra e de Portugal. A tese que as democracias não fazem guerras, nem cometem "democídios" é desmentida pela Guerra da África do Sul do princípio do século em que, pela primeira vez, o sistema de campos de concentração foi inventado pelos ingleses. Episódios polêmicos que deixaram seqüelas, como a guerra de independência da Argélia e a atual revolta dos Fundamentalistas (que já causaram mais mortes do que a luta contra os franceses); a Guerra Civil espanhola e várias guerras tribais na África não possuem tampouco dados exatos de perdas e genocídios. Sempre em tais estudos é difícil evitar parcialidades, preconceitos ideológicos, silêncios deliberados e muita hipocrisia. É evidente que os Aliados cometeram democídios nos bombardeios da 2ª Guerra Mundial e também causaram perdas terríveis em sua tentativa de contenção do comunismo na Coréia e no Vietnam. Menciono esses últimos casos porque me parece uma escandalosa hipocrisia o governo inglês deter agora o general Pinochet, por haver eliminado três mil comunistas, quando foi responsável por centenas de milhares de mortes em seu próprio esforço de resistência ao totalitarismo no período da Guerra Fria.
Na reestruturação global da humanidade talvez esteja certo o japonês Kenichi Ohmae quando, em sua obra The End of the Nation State, antecipa a redução do Estado-nação tradicional a grupos regionais, estruturados em torno de centros de crescimento econômico - como por exemplo o que abrange hoje o Japão, a Coréia do Sul, Taiwan e o litoral da China continental; ou aquele que engloba o Sul do Brasil, o Uruguai e a província de Buenos Aires, como núcleo atuante do Mercosul. Pode ser também que seja substituído por grandes áreas culturais como antecipa Samuel Huntington, o grande filósofo político e professor em Harvard – e, neste caso, o mundo do século XXI comportaria quatro grandes blocos, o Ocidental, o Asiático oriental, o Islâmico e o Russo. Não creio, porém, que tal compartimentação seja viável.
Nunca prosperou um ideal de abertura globalizante, nem entre a extrema esquerda leninista, nem entre a extrema direita, de linha-dura nacionalista. Mas o fechamento autárquico, no gênero do que hoje impera no Irã, Afeganistão, Cuba, Birmânia ou Coréia do Norte - só persiste como ilusão de viabilidade entre aqueles tresloucados que, sob várias bandeiras, vários partidos e vários líderes totalitários, barbudos ou não, pretenderam manter suas nações no estágio, primitivo e provinciano de seus respectivas modelos botocudos. É um beco sem saída. A própria dinâmica do desenvolvimento tecnológico se encarregará de condenar essa solução: os Nehanderthal e Aiatolás de qualquer índole paleolítica jamais impedirão a travessia global das ondas eletromagnéticas. O mundo é hoje um só. É a grande realidade de que nos damos conta neste final de milênio de progresso inédito na história da humanidade. E ainda bem!
Ao levantar essas questões, desejo solicitar a atenção para a evolução “dialética” que a semântica ideológica sofreu desde o fim da Guerra Fria e a derrubada do Império soviético. Historicamente, a Globalização, como problemática, está associada a uma série de outros fenômenos paralelos, de natureza filosófica, que contribuíram para o resultado de modo independente. Há pouco mais de 300 anos, Locke falou em tolerância religiosa e liberdade aplicada ao sistema político, assim como ao direito de propriedade. Em 1776, coincidindo com a proclamação da Independência das colônias britânicas da América do Norte, Adam Smith publicou seu Inquérito sobre as Origens da Riqueza das Nações, estendendo a idéia de um mundo sem fronteiras e de liberdade ao campo econômico, com o propósito de criticar o mercantilismo então dominante. O Mercantilismo se sustentava sobre a soberania do monarca absolutista sobre o patrimônio de toda a nação. Firmada pouco tempo depois, a Constituição dos Estados Unidos confirmou a idéia da viabilidade de uma sociedade livre e aberta ao mundo, com a absorção de homens de todas as raças, religiões e procedências, e pluribus unum – ainda que o princípio momentoso fosse durar dois séculos para, progressivamente, beneficiar os homens de cor e as mulheres. Em 1789, a Revolução Francesa reproclamava as mesmas idéias, com maior ênfase e através de um trauma emocional que repercutiria em todo o mundo. O trinômio Liberdade, Igualdade e Fraternidade firmavam uma doutrina não só suscetível de aplicação global, mas comportando a necessidade implícita de sua universalização. É evidente, contudo, que os três princípios são autônomos e podem entrar em conflito. O conflito não tardou, aliás, a manifestar-se quando a República, firmando-se pelo princípio das nacionalidades, transferiria a idéia de soberania, antes personalizada no monarca absoluto e concreto, para o Estado abstrato.
O Estado nacional soberano surgiu, precisamente, no século XVIII – mesmo que sob formas e regimes diversos, republicano ou de monarquia constitucional, parlamentarista ou presidencialista. A idéia de soberania fora transplantada, por volta dos séculos XV e XVI, do Papado para as várias monarquias nacionais que se constituíam. Os reis passaram a reivindicar um caráter semi-divino ou de intermediários entre a divindade e seus respectivos povos. Maquiavel, Bodin , Bossuet e, em certo sentido Hobbes (Hobbes, na realidade, estava antecipando o domínio do individualismo e transformando a idéia de Estado, seu Leviathan, num conceito meramente instrumental), concederam aos reis o privilégio de receberem sua dignidade “pela Graça de Deus”. Mesmo o general Franco, em pleno século XX, considerou-se “caudillo de España pela Gracia de Diós”. Como rei “cristianíssimo”, Luís XIV, no apogeu da idéia de soberania monárquica, preferiu traduzí-la através dos símbolos da mitologia helenística e do heliocentrismo copernicano, fazendo-se qualificar de “Rei Sol”.
Com o triunfo do republicanismo, foi a noção atribuída ao próprio Estado-nacional e criada uma ideologia ad-hoc. Sua essência consiste em atribuir à nação, nossa “Pátria”, uma dignidade de natureza celestial que, para servir seu soberano prussiano, Hegel deliberadamente coroou como a própria expressão do Geist, o Espírito universal – só que, em face de nossa “pátria” nacional soberana, devem necessariamente surgir outras nações inimigas contra as quais devemos eventualmente entrar em guerra. Morrer e matar pela Pátria passou a ser um dos mais altos ideais do homem. Os massacres inomináveis de nosso século, nas duas guerras mundiais, foi no que deu o Gott mit uns, o Deutschland über alles in der Welt, a France éternelle em cujo benefício deve a terra ser fertilizado, de modo que “un sang impur abreuve nos sillons”, o Dieu et mon Droit, o My country, right or wrong e o “Pátria amada, idolatrada, salve, salve” em virtude de cujo culto “verás que um filho teu não foge à luta, nem teme quem te adora a própria morte!”...
A antítese dialética adquiriu cada vez mais uma conotação maniqueísta: “nós” representamos o Bem e a Verdade, “eles” o Mal e a mentira. A fusão dos aspectos contraditórios da Revolução foi tentada por Napoleão. Mas para alcançar seus fins, l´Empereur e suas águias utilizaram a dinâmica agressiva do Imperialismo francês e a rebordosa causada, que se estendeu à América Latina, e em nosso próprio século à Ásia e África, insuflou um espírito belicoso cujas consequências ominosas não tardaram a ser percebidas. As várias doutrinas se transformaram em “Ideologias” e estas possuem um conteúdo emocional que se polarizou em uma direita e uma esquerda. Havia necessidades de projetar todos os ressentimentos, todos os ódios e invejas em bodes expiatórios apropriados. No início desse desenvolvimento, o Liberalismo foi considerado de esquerda, como eram os whigs ingleses em relação aos conservadores tories. Em seguida, a dicotomia passou a distinguir os coletivistas do Socialismo, de esquerda, e os coletivistas do Nacionalismo, arregimentados à direita. Duas ideologias ad-hoc destinadas a gerar, artificialmente, a “religião civil” que Rousseau propora como substituto para um Cristianismo em deliquescência.
No segundo estágio da evolução, que culmina em agosto de 1914 quando arrebenta a primeira Grande Guerra, socialismo e nacionalismo entram num relacionamento ambíguo que provoca outra guerra mundial e inacreditáveis genocídios. Se, na Alemanha e em outros países europeus, o “fascismo” procura fundir internamente as duas ideologias, ou os dois irmãos inimigos naquilo que, mais apropriadamente, se deveria qualificar como “nacional-socialismo”, da contradição tampouco escapa a “extrema esquerda” comunista. O Estalinismo e o Maoísmo em nada mais consistem, de fato, do que na expressão conjunta das duas tendências, configurando respectivamente um nacionalismo fascista russo e um nacionalismo fascista chinês. A Guerra Civil espanhola (1936/1939), em sua trágica brutalidade e complexidade, representa o episódio final e paradigmático do confronto ideológico característico de nosso século. É a pre-estréia da IIª Guerra Mundial e lembro-me das emoções que suscitou na minha mocidade. A reversão das expectativas ideológicas se processa a um nível subterrâneo entre 1947 e 1989, isto é, no período da Guerra Fria que resulta, precisamente, da resistência às ambições imperiais da Rússia soviética que se valia da Idéia-Força da Esquerda.
Entretanto, contra esse coletivismo tribal primitivo levantou-se, pouco a pouco, uma nova visão destinada a por no centro das cogitações o indivíduo, o homem livre e responsável. Ou seja, nós mesmos, donos de nosso nariz. No princípio do desenvolvimento dessa nova Weltanschauung, o Liberalismo, “liberalismo antigo”, “liberalismo clássico” ou primeiro liberalismo, como tem sido chamado, foi considerado revolucionário e contra ele resistiram obstinadamente, como continuam resistindo, os conservadores, os absolutistas e os nacionalistas. Tocqueville foi o primeiro sociólogo e filósofo político – que considero dos maiores – a antecipar a ruptura do trinômio da Revolução Francesa, diagnosticando a inevitável antítese que se iria criar entre o Liberalismo, de um lado, a Fraternidade patriótica e o Igualitarismo do programa de 89, do outro. Na visão de Tocqueville, expressa em sua obra máxima “De la Démocratie en Amérique”, os EEUU sobrepujaram a colisão que comprometeu a Revolução Francesa porque, em sua comunidade étnica européia, as condições já eram as mais igualitárias possíveis. A comunidade das Treze Colônias constituía uma população de classe média, relativamente homogênea, que conseguira afastar o problema da “instituição peculiar”, a Escravidão, com a presença da etnia africana assim como dos remanescentes da população indígena original. A questão, porém, permanecia e iria provocar, em meados do século XIX, o sangrento enfrentamento da Guerra Civil. Na primeira etapa, só uma contradição fora solucionada. O final se registou nos anos 50 a 70 de nosso próprio século, no que poderíamos chamar a Segunda Revolução Americana, que culminou eliminando, definitivamente, a discriminação tanto em termos de raça quanto de sexo. A Campanha dos Direitos Civis assegura, na verdade, o cumprimento derradeiro daquele texto básico da Declaração da Independência que proclama terem sido os homens criados iguais, com seus direitos fundamentais à vida, à liberdade e à procura da felicidade. Ora, a satisfação do ideário original da nação americana assegura, e só ele podia assegurar, o surgimento da América como campeã da Liberdade. Uma das mais prodigiosas realizações de Tocqueville foi haver previsto, precisamente como o fez ao final de sua obra, que as duas grandes potências do século seguinte seriam a América, paladina da liberdade, e a Rússia, campeã do despotismo. A característica fundamental da comunidade americana, legitimada pelo jus soli, é como já salientamos a abertura total aos homens de todas as raças, religiões e nacionalidades.
Isso nos conduz a concluir que a importância do resultado obtido na evolução da sociedade multirracial americana foi, justamente, elevar o indivíduo como sujeito fundamental do direito, um sujeito livre e, perante a lei, igual a qualquer outro. Considerai que é essa a condição sine qua non para o surgimento eventual de um mundo ecumênico. Sem que exista um regime em que os indivíduos sejam livres, independentemente de sexo, raça, religião e cultura, como produtores e consumidores numa economia de mercado, não é possível imaginarmos a realização da Fraternidade universal, prometida nos Evangelhos e consignada na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789.
Notai que muito poucos países já hoje cumprem as condições necessárias ao ambiente da sociedade global. Além dos Estados Unidos, essas nações são o Brasil, a Austrália e, em termos mais restritos, o Canadá (onde perdura a problemática do Québec francófono). O milagre da África do Sul pode criar um quinto membro dessa comunidade de nações que conseguiram transcender as inatas restrições e discriminações contra membros de grupos étnicos estranhos ao nosso. É como se o que outrora se qualificava como o Novo Mundo houvesse gerado uma cultura já potencialmente globalizada, ao contrário dos regionalismos e nacionalismos de base étnica, em vigor no Velho Mundo euroasiático.
Na Ásia, a persistência dos ímpetos autárquicos, discriminatórios e endogâmicos se revela pela frequência de embates sangrentos entre castas e comunidades étnicas ou religiosas diversas. A hostilidade intratável entre a Índia e o Paquistão, que causou perto de um milhão de mortos no momento da Independência e nas várias guerras subsequentes, contrasta com a doutrina de ahimsa, “não-violência”, pregada por Gandhi. A Indonésia sofre, no momento, de conflitos internos da mesma natureza entre a maioria muçulmana e as minorias chinesa (em grande parte budista) e cristã. A perseguição às minorias cristãs é notória na China e em muitos países árabes sob governos fundamentalistas islâmicos. A Malásia se separou de Singapura precisamente pela incapacidade de suas duas etnias dominantes, os malaios islamizados e os chineses, de conviverem pacificamente. Os conflitos internos que ameaçam a integridade da China, no Tibet e no Turquestão, provêm de contenciosos da mesma natureza. Na Europa, o grande exemplo contemporâneo dessa situação de distonia é a Iugoslávia. O Estado multinacional se desintegrou em guerra civil em virtude das discórdias entre os sérvios ortodoxos, outrora hegemônicos, os católicos da Croácia e Eslovênia, e os muçulmanos da Bósnia e Kôssovo.
A superação dos conflitos nacionais que ensanguentaram a Europa desde o surgimento do Princípio das Nacionalidades, implícito no espírito da Revolução Francesa, se deu através do movimento de integração econômica que culminou com a constituição do Mercado Comum, o qual se encaminhou, rapidamente, para uma integração também política. O estímulo para esse processo surgiu, logo depois da IIª Guerra Mundial, pela consciência de franceses e alemães que não podiam prosseguir na sequência de vendetas e revanchismos que assolavam todo o continente. De Gaulle e Adenauer foram os eminentes protagonistas de tal curso de singular sabedoria política. Não nos esqueçamos, porém, que o instrumento prático para o sucesso do movimento se revelou residir na solidariedade econômica. A integração da CEE se iniciou, sabiamente, pela comunidade do carvão e do aço entre as duas nações centrais, França e Alemanha. Não há dúvida que nosso próprio Mercosul encontrou seu modelo na comunidade da Europa ocidental. Esperamos que em nosso Cone-Sul seja definitivamente eliminada a hostilidade artificial que, durante 150 anos, prejudicou o relacionamento entre Brasil, Argentina, Chile, Uruguai e Paraguai.
Paralelamente a tal processo integrativo se regista um outro, oriundo de tradições históricas ainda mais antigas. É o que provoca o impulso pela autonomia de entidades regionais ou provincianas, cuja identidade pode ser determinada pela religião, a língua ou certas peculiaridades étnicas. Os exemplos mais salientes são o da Grã-Bretanha e da Espanha. A tradição histórica unificadora e centralizadora de Castela cedeu, finalmente, em grande parte graças ao rei João Carlos e ainda como reação ao trauma da Guerra Civil, à iniciativa de conceder autonomia à Catalunha e ao País Basco. Do mesmo modo, a Escócia obteve o direito de constituir seu próprio Parlamento, com o privilégio de criar uma legislação própria. O País de Gales está reivindicando um regime semelhante. Minorias fanáticas recorrem ao terrorismo ao enfrentarem as resistências da população mais moderada na Irlanda do Norte e no País Basco. Na Itália, o Norte próspero e industrial se ressente de ser governado pelos políticos semi-mafiosos de Nápoles e Sicília. A desintegração do Império soviético, sucessor do tzarismo, obedece a um mesmo processo histórico. No caso, o que se passou com a URSS se assemelha tanto a esse processo de regionalização, quanto ao que ocorreu com os Impérios coloniais europeus, após o término da IIª Guerra Mundial, por força do princípio das nacionalidades. A legitimidade de tais movimentos regionalistas só se estabelece, todavia, quando não recorrem à força: é inaceitável a pretensão do IRA de integrar o Ulster à Irlanda quando a maioria protestante e anglófona da população dessa província prefere manter seus laços com o Reino Unido. Na França, a Córsega sofre do mesmo separatismo da bomba e da metralha. Na própria URSS, o processo não foi indolor, como vimos no episódio da secessão da Che´snya e dos conflitos que dividiram a região do Cáucaso, afetando a Geórgia, a Armênia e o Azerbeidjão.
A situação mais triste é a da África. A estrutura basicamente tribal do continente ao sul do Sahara entra em colisão com a idéia de nacionalidade, introduzida pela organização colonial de origem inglesa, francesa, belga e portuguesa. Dois casos particulares são instrutivos; o da Nigéria que tem conhecido uma convivência difícil entre suas grandes tribos, os Haussás islamizados do Norte do país, os Igbôs do Sudeste, que sofreram o impacto dos missionários protestantes e formam uma etnia excepcionalmente dinâmica, e os Iorubás, da Nigéria sul ocidental. E a triste sorte de Angola que resulta da combinação de fatores tribais, contaminados pela ideologia marxista trazida por cubanos, alemães orientais e russos.
De um modo geral, podemos resumir esse aspecto da problemática que estamos estudando pela ação contraditória de forças centrífugas e forças centrípetas. As primeiras “balcanizaram” a Europa oriental e o antigo Império espanhol da América. As segundas, mantiveram a unidade das grandes potências modernas, atuais ou emergentes, como os Estados Unidos, a China e o Brasil. Nas Nações Unidas, que já abrigam hoje umas 170 nações – não sei se é isso mesmo, já perdi a conta! – convivem uma variedade de estruturas nacionais de origem, poder econômico e militar, e de significado demográfico e cultural extremamente diversos, criando uma enorme confusão que torna tão ineficaz a Organização como modelo de um futuro Governo mundial.
De meu ponto de vista, a conclusão que podemos retirar da breve análise realizada acima, na perspectiva deste final de século, é que a estrutura inflexível do Estado-nação soberano tornou-se, obviamente, obsoleta. Mas vejam bem! O que considero obsoleto é o conceito de soberania. É difícil imaginarmos a sobrevivência de mini-estados como alguns que vamos encontrar na Polinésia, na África ocidental e na América Central e do Sul. A tradição dos símbolos da Pátria, criada em 1789 como conclusão do processo de declínio do Absolutismo monárquico patrimonialista e em obediência à tese da “religião civil” da proposta de Rouseeau, alcançou o final de sua utilidade. Passaportes, alfândegas, hinos nacionais, bandeiras, tropas desfilando em ordem unida para “apresentar armas” a líderes nacionais ou estrangeiros – todos esses elementos da simbologia nacionalista podem persistir em alguns países em que o processo histórico de integração é multissecular e glorificado por eventos de sentido quase místico. Seria o caso do nacionalismo francês, por exemplo, cujas raízes podem ser encontradas na epopéia de Joana d´Arc. O General De Gaulle ainda era muito cioso de todos esses apetrechos, mas assim mesmo sua visão era bastante larga para imaginar uma “Europa do Mediterrâneo aos Urais”...
Mas o mimetismo modernizante que leva o Burundi a se constituir em nacionalidade autônoma, através de métodos artificiais, acaba provocando tragédias como o genocídio da etnia Tutsi. O mesmo espetáculo lamentável está sendo registado em várias outras partes do mundo. Afinal de contas, as duas Guerras mundiais do século XX podem ser explicadas pelos instintos tribais que se tornam grotescamente agressivos quando uma ideologia grosseira, de natureza coletivista, se serve de outra tendência natural do homem, a de repúdio ao diferente, ao estranho, ao forasteiro, ao “outro” cuja cor de pele, conformação craniana ou língua são diversas das nossas, para tentar consolidar-se. Quando se fala, talvez com certa ingenuidade, no Fim das Ideologias, o que se propõe é um ambiente de convivência tolerante entre pessoas individualizadas, independentemente de sua religião, cor ou sexo. Sem tolerância, a própria democracia pluralista não faz sentido. Insisto, por isso, no sentido que o individualismo faz parte integrante da estrutura da sociedade liberal em processo de globalização.
Na nova perspectiva universal, surge então a questão mais difícil do relacionamento entre o econômico e o político (ou cultural e religioso). Verificamos que os dois fatores em geral colaboraram para a extensão progressivamente mais ampla da consciência ecumênica. Piano Carpini viajou até a Ásia Oriental por motivos políticos de base religiosa. Marco Polo por motivos puramente comerciais. Colombo descobriu a América e Vasco da Gama o caminho das Índias pela combinação dos dois impulsos. Na própria economia, porém, a evolução se processa pela substituição de uma visão patrimonialista e mercantilista fechada, como a que ainda dominava o Ocidente e o Oriente no século XVIII, e o horizonte do mercado aberto universal que anima os mais audazes e lúcidos descobridores, colonizadores e investidores. Ao pesquisar e aconselhar uma economia aberta, se estava Adam Smith referindo tanto a um mercado interno, quanto a um mercado externo, inerente à noção de livre-cambismo.
É fato, de qualquer forma, que o comércio parece haver exercido uma influência prioritária na abertura para o relacionamento pacífico entre os povos. O relacionamento entre tribos, mesmo no ambiente primitivo da floresta amazônica, se faz inicialmente pela troca pacífica de objetos, antes do que pela desforra bélica. A famosa tese do Senhor e do Escravo, que Hegel propôs e tanto influenciou Marx na elaboração de sua teoria da Luta de Classes, perde de vista que o comércio pode, em última análise, abrandar a agressividade inata do Homo Sapiens. Esta, que é uma espécie carnívora, ao mesmo tempo gregária e belicosa, é também uma espécie racional como Hobbes vislumbrou, capaz de concluir o Contrato Social por interesse comum a longo prazo. O exemplo mais evidente do processo de racionalização é a instituição da Escravidão. Originariamente, os prisioneiros de guerra era normalmente trucidados e, às vezes, comidos em festim canibalesco, para lhes absorver as virtudes secretas. Suas mulheres eram estupradas ou igualmente mortas. A preservação do prisioneiro nas guerras tribais, para a venda como escravo, constituiu, nesse sentido, um progresso da racionalidade sobre o instinto. Eventualmente, se descobrirá que o empregado livre, trabalhando contra pagamento, é mais eficiente na produção. O que se pode dizer é que os instintos tribais permanecem, mesmo na Europa e na Ásia civilizadas, de modo que um sérvio tenha tanta repugnância em aceitar a convivência com um albanês quanto um malaio com um chinês. O relacionamento econômico no mercado possui a virtude de transcender tais preconceitos étnicos e, pela sua própria despersonalização, conduzir à abertura do mercado na amplidão global que hoje se manifesta. Se possuo um Computador americano com um Monitor fabricado em Tijuana, no México, um No-break brasileiro e o Fax da Panasonic japonesa, fabricado na China, não preciso saber se os fabricantes de tais produtos são católicos, budistas, brancos, ameríndios, monárquicos, poligâmicos ou comunistas. Nada nisso importa. Afinal de contas, contrariamente aos preconceitos propagandísticos da Esquerda brasileira, o Mercado “neoliberal” não come criancinhas, nem executa “limpezas étnicas” nos territórios respectivos de produtores e clientes. Criancinhas, para dizer a verdade e em que pesem as angústias fidelistas do Senador Roberto Freire, estão sendo comidas pelos camponeses da Coréia do Norte porque estão morrendo de fome, eis que seu governo maoísta tem mania de grandeza e fabrica mísseis intercontinentais, ao invés de permitir as técnicas eficientes da agricultura em regime de propriedade privada. A autarquia não funciona, ponto final.
As considerações precedentes levantam a questão de saber se a liberdade política, que é pressuposto da democracia, depende ou não da liberdade econômica – e se ambas exigem ou não o processo de globalização do mercado. A questão é controvertida. Hayek tornou-se o mais eminente economista da segunda metade do século ao argumentar, como já assinalamos, que a intervenção do Estado na economia, através de todas as formas constrangedoras, desde as mais brandas do socialismo democrático, até as mais ferozes do comunismo estaliniano ou maoísta, conduz irremediavelmente à servidão totalitária. Outros alegam, com razão, que o processo de conquista da liberdade política ocorreu na Europa ocidental e se estendeu, posteriormente, a outros continentes, sem que isso implicasse a existência de um mercado livre no âmbito interno e no externo. Não nos esqueçamos que um mercado interno livre pode, amiude, conviver com uma legislação protecionista como foi, em certa época, o caso de muitas nações entre as hoje mais desenvolvidas, inclusive os Estados Unidos. A Grã-Bretanha foi a primeira a pregar o livre-cambismo porque já era rica e dominava os mares. Mas acontece que o Japão pode ser uma democracia e alegar a existência de uma economia capitalista quando, na verdade, continua sendo um dos países mais fechados do mundo. O japonês não compra produtos estrangeiros, não porque esses produtos sofrem acréscimos de preço pela taxação aduaneira, mas porque prefere comprar o que é japonês. A introversão nipônica cria um problema para seu inter-relacionamento humano com o estrangeiro, revelando-se um sério obstáculo ao processo “mental” de globalização. E a crise por que passa atualmente o Império já é sintoma dessa dificuldade.
Ora, é também verdade que uma ditadura pode, excepcionalmente, conduzir à abertura econômica segundo os princípios da Escola Austríaca ou da de Chicago. Foi o caso do Chile à época de Pinochet – esse mesmo Chile que é hoje o país com os mais altos índices de desenvolvimento da América do Sul e um daqueles em que melhor parece consolidada a democracia. É o caso da China de Deng Xiaoping, procurando a convivência entre os “dois sistemas, um só país”. A própria Cuba fidelista está fazendo tímidas tentativas nessa área, através do turismo, sem abandonar o draconiano poder ditatorial do El Comandante. A questão da possibilidade de convivência indefinida de um Estado Nacional soberano de modelo clássico, ideologicamente legitimado e provido de alfândegas, câmbio controlado e domínio estatal sobre o comércio internacional (o Trade), com o Liberalismo, me parece, contudo, duvidosa. Mais cedo ou mais tarde, uma economia nacional estatizada e fechada entra em conflito com as exigências da competição internacional. O modelo da prosperidade dos libertários acaba sendo contagioso, ele deita por terra qualquer Cortina de Ferro (ou de Fumaça...), Muralha da China ou Muro da Vergonha.
Os nacionalistas econômicos não parecem se dar conta que o que funciona em âmbito do comércio internacional sempre foi o mercado de livre concorrência. Quem se fecha em autarquia deve estar disposto a pagar um preço elevadíssimo. Se Cuba está na miséria, não é por causa do “bloqueio” norte-americano - que na realidade não existe, pois bloqueio comporta estritamente o uso da força naval – nem mesmo do simples embargo que sofre, semelhante àquele que, durante décadas e inclusive pelo Brasil, foi usado para forçar a África do Sul a abandonar sua política de apartheid. Mesmo durante os 70 anos em que o comunismo dominou a União Soviéticas, ela foi obrigada a comerciar e competir com as outras nações no mercado mundial que, por definição, é livre porque não pode ser controlado por ninguém. Foi o insucesso da URSS nessa competição o que finalmente obrigou os líderes do Kremlin a abandonar seu sistema que, além de injusto e despótico, era pavorosamente ineficiente.
Um outro aspecto, e não menos importante, da matéria sobre a qual nos estamos debruçando diz respeito à questão da extensão universal dos princípios jurídicos que sustentam a democracia. Num artigo recente na FOLHA DE S.PAULO (6.6.99), Roberto Campos refere-se às intuições de Henry Kissinger, o “Mago da Realpolitik,” que ele elogia como talvez um dos primeiros formuladores da teoria do novo equilíbrio de poder. Essa teoria está, na verdade, concedendo aos Estados Unidos o papel de uma espécie de Gendarme do mundo global. A idéia de imposição de uma “justiça global” tem sido estimulada, recentemente, pelos horrores das guerras civis na Iugoslávia. As operações americanas contra Gadafi, Noriega, Saddam Hussein, o Sudão, o Afeganistão e a Sérvia, confirmam a auto-proclamada intenção dos EUA de se transformarem em justiceiros globais. A tese que o Juiz e o Policial configuram a estrutura básica da sociedade americana foi proposta pelo sociólogo liberal francês Michel Crozier, na obra Le Mal Américain. O episódio da “Guerra de Kôssovo” possui entre muitas originalidades – inclusive a de haver sido o primeiro conflito bélico da história em que um dos contendores não perdeu um único soldado em combate! – a de revelar o Presidente dos EUA como capitão inconteste de uma turma de policiais, fortemente armados e interessados em impor o respeito universal pelos direitos humanos quando abertamente desafiados por um regime criminoso. Interesse nacional egoísta em ampliar seu território ou conquistar novas fontes de recursos naturais não foi, com certeza, a motivação de nenhum dos membros da OTAN que participaram da operação. Trata-se, na verdade, da aplicação local mais evidente de um princípio em virtude do qual os Aliados ocidentais se empenharam na IIª Guerra Mundial. A violação maciça de tais direitos por uma gangue atrabiliária e agressiva (como foi interpretado o Partido Nazista) ameaça a segurança coletiva dos demais cidadãos pacíficos, mundo afora, requerendo, consequentemente, tais medidas extraordinárias de represália. Se a Primeira Guerra Mundial pode ainda ser descrita como um confronto clássico entre grupos nacionais, concorrendo na disputa de recursos escassos, ou como a expressão normal da “política por outros meios” de Clauzevitz, com extraversão da Libido dominandi, já a Segunda se apresenta melhor não só como um contencioso ideológico, mas como uma vasta operação repressiva, destinada a manter os Direitos do Homem tais como definidos na Magna Carta inglesa, na Declaração de Independência americana e na mesma Declaração da Revolução francesa.
De onde se deduz que o fenômeno que estamos estudando deve incluir, como coluna essencial do edifício da Ordem Internacional em construção, a Globalização da Justiça. O Tribunal de Nuremberg se transforma agora no Tribunal de Haia. Tudo isso merece efusivos aplausos. Anuncia um aspecto admirável dessa superação da idéia de soberania do Estado Nação, implícita no Liberalismo globalizado deste final de século. Acontece, porém, que a maneira de por em prática a tese deve ser cuidadosamente pensada. É mister evitar aberrações jurídicas como a detenção de Pinochet na Inglaterra, que viola uma série de outros princípios bem definidos como o da não-retroatividade das leis, respeito às imunidades diplomáticas e dos ex-chefes de Estado em visita, e área de jurisdição para aplicação da lei. A idéia de julgar e punir os líderes inimigos num Tribunal internacional confirma a presunção e consolida o propósito de criar uma Justiça internacional, em qual caso se transformaria a OTAN numa espécie de Força policial que usaria a aviação de bombardeio como arma predileta, para impor as decisões que os dirigentes do Grupo dos Sete consideram necessárias, por irresistível pressão da opinião pública internacional.
Disso se pode concluir que os Exércitos nacionais estão condenados. As Forças Aliadas operam agora como polícias militares sob o comando do Poder hegemônico e quanto mais cedo viermos a participar desse Conselho mundial, melhor. A Força militar, exercida sob o amparo de decisões da ONU, será sempre parte de uma Força internacional que visa a fazer respeitar a Carta. Permito-me, nesse ponto, opinar no sentido que a tentativa diplomática do Brasil de obter um assento permanente, com direito a veto, no Conselho de Segurança da ONU é ocioso e tolo. O Conselho de Segurança deverá, sem dúvida, reformular suas constituição se a ONU desejar um dia ser mais eficiente em sua ação internacional. Bem melhor contudo faríamos se reivindicássemos, desde logo, e tão pronto quanto possível após a superação de nossa atual “crise” econômica e financeira, um lugar na cúpola do G-7, que passaria então a ser o G-8. Já possuímos um PIB e um peso geopolítico superior a alguns dos membros desse Grupo atualmente hegemônico, além de podermos agir como representando um continente inteiro – o que tornaria lícita nossa pretensão. E assim também deveríamos, no meu entender, em face da perspectiva militar que se desenha, admitir um projeto que comportasse a extensão da Organização do Tratado do Atlântico Norte ao Atlântico Sul, de maneira que viéssemos eventualmente a pertencer a essa nova OTA, assegurando a paz e a segurança neste cone sul do planeta. Para isso seria necessário, porém, que os dirigentes do Itamaraty abandonassem a diplomacia da avestruz, que há décadas define sua timidez e preguiça, para pensar em termos globais, numa visão mais larga e desprovida de preconceitos e ressentimentos.
Chego assim à conclusão que a verdadeira crise histérica que afeta nossa Esquerda, agora fortemente reforçada pelas fantasmagóricas preocupações da Direita, de índole paranóica, com a Amazônia, a ‘biomassa” das florestas tropicais, a privatização das estatais, a entrada na bolsa de capitais estrangeiros ditos “especulativos”, a concessão a bancos estrangeiros do direito de operarem no Brasil, e outros duendes do mesmo estilo, comporta o desejo romântico e reacionário de conservar um controle autárquico da economia, como expressão de uma imagem inconsciente, inspirado na visão paradisíaca do velho Brasil dos sobrados e banguês coloniais. Coincide aliás, e em parte se explica, pelo interesse não muito lícito da Nomenklatura tupiniquim de preservar seus “direitos adquiridos”...
Por que o Brasil, com uma tradição absolutamente oposta e condições propícias à abertura, teria de se manter trancado no Autismo nacionalista? Já somos um povo multirracial, formado por imigrantes. Nossa tradição mais legítima é de abertura, de cordialidade e tolerância. O único handicap que sofremos é o da língua, um idioma até certo ponto confidencial. O cidadão do futuro deve, porém, ser pelo menos bilíngue. Na medida em que optamos por conservar a estrutura do patrimonialismo num regime autárquico, ficaremos forçosamente privados das benesses e do desenvolvimento que a globalização aberta proporciona. Que o processo de transição de um sistema para o outro provoque crises e sofrimentos, ocasionais e localizados, não tenho dúvidas. Mas me pergunto se há alternativas. Mesmo a China, a potência que por sua velha tradição histórica e condições demográficas, geográficas e riqueza em recursos naturais, se poderia permitir a sobrevivência em regime fechado de autarquia econômica, política e cultural, está se preparando aos poucos para aderir ao mundo moderno. O slogan é “uma nação, dois sistemas”. Episódios como o massacre de estudantes na Praça da Paz Celestial pode ser diabólico, mas representaria apenas uma interrupção transitória num desenvolvimento irreversível para as Portas Abertas, desenvolvimento que, em obediência à mais antiga tradição chinesa, deve ser lento e prudente.
A obra de Popper, “A Sociedade Aberta e seus Inimigos”, e a não menos importante “Les deux Sources de la Morale et de la Religion”, de Bergson, fixaram há mais de meio século as condições filosóficas de uma sociedade livre em âmbito internacional. Despencar-se em acusações falsas, injuriosas, caluniosas e cretinas contra um pseudo “neoliberalismo”, como se fosse um bicho-papão, é apenas sinal de ignorância crassa, fanatismo ideológico, neo-bobismo ou desesperado recurso astucioso de quem deseja apenas conservar privilégios egoístas.
Uma definição admirável do que deverá ser a organização mundial no próximo século foi, em abril último, oferecida pelo Presidente da República tcheca, Vaclav Havel, perante o Parlamento canadense em Ottawa. Desejo concluir meu argumento citando alguns pensamentos desse que, não somente é um dos heróis da luta contra o totalitarismo e a ocupação estrangeira em sua pátria, mas um grande intelectual, escritor e teatrólogo, digno de confiança geral não só por seu passado mas pela posição que ocupa. A visita de Havel ao Canadá coincidiu com o início dos bombardeios da OTAN contra a Iugoslávia, sendo que a República tcheca se tornou recentemente membro dessa aliança militar, juntamente com seus vizinhos, a Polônia e a Hungria. Em sua oração, o Presidente tcheco acentua várias vezes que a guerra contra a Iugoslávia representa um marco na história das relações internacionais por ser a primeira vez que o casus belli era a intenção de fazer respeitar direitos humanos – não tendo os membros da OTAN qualquer interesse econômico, de petróleo ou outro, nem qualquer ambição territorial contra a Sérvia. Havel insistiu na idéia, não obstante a relutância da maioria da opinião pública de seu país em aceitar a necessidade dos bombardeios para impor o respeito a tais direitos. O principal trecho da oração do chefe de estado tcheco pode, contudo, servir de conclusão a nosso próprio arrazoado neste ensaio.
“Tudo indica que a glória do Estado-nação como culminância de todas as comunidades nacionais na história já passou de seu ponto mais elevado”, disse o Presidente. “ Parece que os esforços esclarecidos de gerações de democratas, a experiência terrível de duas guerras mundiais e a evolução da civilização finalmente obrigou a humanidade a reconbhecer que os seres humanos são mais importantes do que o Estado”. O Estado, explicou Vaclav Havel, era considerado o mais alto valor terrestre, na verdade o único em nome do qual era permissível matar e em favor do qual se considerava lícito que as pessoas oferecessem sua própria vida. Num mundo que se globaliza, entretanto, “todos nossos destinos individuais se estão fundindo num único destino – de tal modo que é o mundo, quer estejamos ou não satisfeitos com isso, que deverá carregar a responsabilidade de tudo que ocorre. Em tal mundo, o ídolo da soberania estatal se deverá inevitavelmente dissolver”. Havel não nega a necessidade da existência do Estado, mas prevê que ele se transformará numa entidade muito mais simples, menos poderosa e mais civilizada, uma mera unidade administrativa numa organização planetária mais complexa, com múltiplos degraus, regionais e transnacionais de expressão. Quanto mais depressa os povos sobrepujarem a idéia soberana do “interesse nacional”, afirmou o grande político theco - em favor do conceito de direitos humanos universais melhor será para os interesses universais comuns de todos os povos da terra. Seguindo as intuições do Presidente da República tcheca também creio que o mundo do século XXI – no caso da Humanidade ser bem sucedida no enfrentamento dos perigos que ela fabricou (concocted) para si própria – será um mundo de cooperação mais íntima e mais equitativa entre entidades, principalmente supranacionais, envolvendo continentes inteiros. Havel concluiu seu discurso com a afirmação de que “enquanto é o Estado uma criação humana, os seres humanos são criação de Deus”.
O fato é que, ao final, não podemos conceber como se desenhará o futuro político da humanidade no próximo século. Ninguém sabe, aliás. O futuro depende das decisões individuais dos bilhões de habitantes deste planeta e essas decisões são imprevisíveis. Vislumbramos apenas que a racionalidade, o bom senso e a tradição do Ocidente, ao qual pertencemos, indica a necessidade de uma cooperação e intercâmbio pacífico cada vez mais intenso, diversificado e de âmbito cada vez mais vasto. Não obstante, a criação de blocos econômicos e culturais, integrados numa Ordem Internacional global, é uma possibilidade como degrau na hierarquia de poder mundial previsto. Os problemas de ecologia, a camada de ozônio, a chuva ácida, a destruição das florestas tropicais, a alimentação de uma população mundial em expansão explosiva e reclamos gerais de eliminação da pobreza, além das exigências de combate a fenômenos como o crime organizado, as drogas e o terrorismo, bem como o aparecimento, local e ocasional, de tiranos de vezo agressivo – impõem, certamente, um crescente entrosamento dos dirigentes das potências mais poderosas, o que poderá conduzir, por força mesmo da lógica do poder, à procura de uma organização política supra-nacional.
Não acredito que essa organização futura conduza ao Imperialismo. A estrutura do Estado-nação provavelmente perdurará no próximo século mas o que está perempto é o conceito de soberania. O Imperialismo, como modelo que encontrou sua formulação historicista nas antecipação tresloucadas de filosofia da história de Spengler e, até certo ponto, na de Toynbee; a mesma que Lênine também antecipou, para seus próprios fins oportunistas na sua definição, baseada em Marx e na realidade européia de princípios do século XIX – não é mais viável num mundo regido pela Lei (the rule of law) da organização internacional. E nesse ponto podemos salientar que a tradição do direito consuetudinário anglo-saxão é muito mais flexível e adaptável ao âmbito da globalização do que o modelo do direito romano.
. Não acredito, tampouco, na hipótese de Samuel Huntington, o grande cientista político de Harvard que prevê a consolidação de vários blocos, circundando pólos econômicos-culturais como o Ocidental, o Chinês, o Russo, o do Islam. Esses blocos são, a meu ver, vulneráveis ao fenômeno global irreversível da própria globalização das comunciações. No artigo acima citado, Roberto Campos também assinala que os problemas da transição da situação de dominação dos Estados Unidos para a que ele qualifica de “hegemonia contestável... navegando entre os escolhos do idealismo de estilo wilsoniano, com seu tom excessivamente moralista, e do isolacionismo que privaria o mundo ocidental de uma liderança substancialmente benigna – são problemas positivos. Sua intuição me parece correta.
Em conclusão: o temor do crescimento da potência hegemônica até o ponto de implantação imperialista– no caso atual, os Estados Unidos da América, como uma espécie de nova Roma em projeção da “visão binocular da história” da tese toynbeana – me parece injustificado. Isso, pela razões mesmas da novidade constituída pela emergência do individualismo liberal moderno, sob um Estado de direito. Acredito, otimisticamente, que a fórmula do Imperialismo clássico foi superada pelas condições atuais da internacionalização da democracia liberal que pressupõe a descentralização e atomização do Poder concentrado no Estado. Estamos realmente diante de uma novus ordo saeclorum tal como foi formulada pelos Pais Fundadores americanos e comentada por Hannah Arendt em sua obra On Revolution. Estamos, em suma, caminhando para uma organização hierárquica, de tipo Confederação global, através dos “estados”, regiões ou províncias federadas, dos Estados-nação privados de soberania e das grandes Comunidades econômico-políticas de tipo CEE, NAFTA ou Mercosul.
Nessa hipótese, a Revolução liberal globalizante seria mesmo o termo final da Revolução Mundial. Iniciada como paradigma espiritual pelo Cristianismo (com sugestões proféticas anteriores em Isaías), ela encontra sua primeira expressão concreta na Reforma protestante e nas grandes utopias do Humanismo e Iluminismo da Idade das Luzes.
[Conferência pronunciada em dezembro, 1999, no Conselho Técnico da
Confederação Nacional do Comércio, Brasil]